BENVINDO

que bom que você veio amigo , sua presença me alegra saber que queres desfrutar de algum tempo lendo o que posto nesse espaço que compartilhando nos edificamos .
Powered By Blogger

Sociedade Biblica do Brasil

livros que devorei

  • a proclamação do evangelho karl barth
  • as confissões de agostinho
  • discipulado Bonhoeffer
  • diário de um sedutor kiekggard
  • evangelho segundo joão apostolo joão
  • noite escura san juan de la croix
  • o alquimista paulo coelho
  • resistência e submissão bonhoeffer

rosas á vida

rosas á vida
ainda que á morrer o coração ainda pulsa , rosas á vida e não á morte ainda que sangre , que doa ,que soframos por isso , levantemo-nos e respiremos. rosas á vida

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Manifesto Neo-Ortodoxo

José Luiz Martins Carvalho Artigos
No início do século XX, a teologia cristã estava dominada por um movimento denominado liberalismo teológico, como implicação religiosa de todo o racionalismo e relativismo advindos do iluminismo europeu. Este movimento havia exacerbado a noção de imanência divina a tal ponto de não mais se considerar necessária a Revelação de Deus para que o homem pudesse conhecê-lo. Para o pensamento teológico liberal, há continuidade entre Deus e o mundo, não havendo, portanto, impossibilidade ontológica de o ser humano conceber o conhecimento de Deus pelas vias da Razão. Foi precisamente contra isto que um grupo de teólogos capitaneados por Karl Barth, Eduard Thurneysen, Friedrich Gogarten, Rudolf Bultmann, Paul Tillich, entre outros, levantou a sua voz.
Inicialmente denominado de “teologia dialética” na Europa e, mais tarde, de “neo-ortodoxia”, nos Estados Unidos, este movimento tem a Palavra de Deus como princípio arquitetônico de todo o restante de seu labor teológico, que é classificada por historiadores de quaisquer confissões cristãs como uma “teologia kerigmática”, que solapou o liberalismo secularizante e o fundamentalismo árido. É o resultado da crise política, estrutural e cultural que surgiu no pós-guerra (1ª Guerra Mundial): reação à teologia liberal e seu mito do “progresso” humano (desenvolvimentismo ou progressivismo, mormente defendido pelas ciências naturais no evolucionismo).
A neo-ortodoxia não é uma corrente doutrinária, mas uma forma de fazer teologia, caracterizada, sobretudo, pelo método dialético, que se desdobrou mais tarde na analogia de Barth, na correlação de Tillich e no existencialismo de Bultmann, e pela ênfase na Revelação, como uma resposta ao liberalismo clássico, seja conforme expressa na versão cristológica de Barth, na resposta de Tillich ou no querigma de Bultmann.
As Escrituras são reconhecidas pelos neo-ortodoxos como Sagrada Escritura, isto é, como documento original do evento conhecido como “Jesus, o Cristo”, que é o critério de toda Escritura e a manifestação do princípio protestante. O Evento Cristo não é entendido meramente como fato historicamente observável, mas como fato real, como a intervenção salvífica de Deus na História. Enquanto o liberalismo e o fundamentalismo buscam a segurança para a veracidade da Revelação Bíblica na comprovação científica e histórica, a neo-ortodoxia caminha plenamente de acordo com o princípio reformado de que a capacidade de reconhecer a Bíblia como Palavra de Deus não provém de estudos históricos ou arqueológicos, mas pela ação do Espírito que outorga a fé, conforme afirma Calvino: “procedem insipientemente, porém, aqueles que desejam que se prove aos infiéis que a Escritura é Palavra de Deus, pois que, a não ser pela fé, [isso] se não pode conhecer” (Institutas I, VIII, 13).
Não obstante, é necessário esclarecer que esta subjetividade não elimina a segurança da revelação bíblica, pelo contrário, ela a reforça sobremaneira, porque a coloca sobre a base correta, que não é a da verificação histórica ou científica, mas a do testemunho e da testificação do Espírito Santo! O mesmo agente da inspiração é aquele da testificação. Essa é a nossa única segurança e ela é plenamente subjetiva. É por isso que a neo-ortodoxia entende a Revelação de forma extremamente dinâmica: ela se expressa nos atos e palavras de Deus na história, especialmente em Jesus Cristo, conforme testemunhado nas Escrituras e proclamado pela Igreja. Em todos estes níveis, Deus se Revela através da ação do Seu Espírito!
Sendo assim, a teologia neo-ortodoxa é sempre um fundamento à proclamação do Evangelho ao mundo, isto é, ao Querigma. E o Querigma é sempre um apelo a uma decisão existencial, de fé, para aqueles que não viram, mas que devem crer, sem nenhuma outra segurança além da própria ação do Espírito no coração. E deve-se dizer que o Quérigma não nasce a-historicamente, antes é expressão de uma postura existencial, caso contrário, segundo o apóstolo Paulo, é verborragia.
Para a neo-ortodoxia, a fé como comprovação de fatos é algo meramente racional, diferente da fé bíblica. A fé fundada na verificação de fatos exige a razão, mas a fé bíblica exige a pessoa inteira, na verdade o sentido da sua vida. Se faltar esta verdade, faltam os motivos e sentidos de viver. A fé bíblica é a que solicita participação, engajamento, envolvimento, não de uma parte do ser humano, mas dele todo. Não é ter uma verdade, é, antes, estar tomado por esta verdade. O chamado da fé é, por isso, incondicional em sua exigência. Não é só para “acreditar” que Deus existe ou que Ele é o Criador, mas para amá-lo de todo o entendimento, alma e coração. Não exige e pede só a razão, mas, acima de tudo a existência do crente, sendo Deus a sua preocupação primeira e última, o seu sentido primeiro e último.
No que se refere à interpretação bíblica, um neo-ortodoxo não despreza a escola histórico-crítica, mas entende, com Barth, que este método não chega aos objetivos, pois detém-se nas folhas e não vai ao caule, fica na periferia e não desce ao centro. Assim como o “filologismo” da crítica-textual. Com isso, a neo-ortodoxia volta-se às Escrituras como princípio primeiro da teologia, sem desprezar seus dois elementos de entendimento (histórica e textual), mas não limitando-se a seus resultados. Busca, então, nos clássicos (reformadores, como Lutero e Calvino, além de Agostinho e o Padres Antigos) para resgatar os valores destruídos pela análise meramente histórica da teologia liberal. Os contrastes entre a Ira e a Graça de Deus, entre o Pecado do Homem e a Justiça, colocados sempre sob o prisma do Tempo e da Eternidade, fascinaram o movimento. Tempo e eternidade, homem e Deus, céu e terra, estarão sempre dialeticamente colocados, assim como Igreja Visível e Invisível (Calvino), Instituição e Movimento (Lutero).
Paralelamente, esta perspectiva vai confrontar também a visão fundamentalista em relação à Bíblia, que despreza a tensão dialética entre a letra (as condições do texto escrito) e sua mensagem (o Logos Eterno). Como o totalmente transcendente (Deus) pode ser encontrado na imanência (história), o absoluto (Deus) no efêmero (homem). Donde logo se vê que a síntese é Jesus Cristo. Palavras divinas e ações divinas não podem ser confundidas com palavras humanas e ações humanas (a distância entre céu e terra, tempo e eternidade, permanece), Deus é transcendente. A Escritura é testemunho sobre Deus: aponta para a verdadeira revelação, o Logos Divino, Jesus Cristo (síntese do tempo e da eternidade, do absoluto e do efêmero, do permanente e do transitório: Deus-Homem). Com isso, nega-se também a Teologia Natural, tão querida dos escolásticos e dos liberais. Esta teologia não existe como tal. Qualquer teologia nasce e alimenta-se nas Escrituras, quando a sabe abordar de modo profundo (leia-se dialético). Esta dialética é feita assim: de um lado a história, de outro a Escritura e, desta síntese nasce a palavra divina para o contexto vital.
Destarte, a hermenêutica neo-ortodoxa vai nortear-se pela famosa assertiva de Karl Barth, que diz que um teólogo só pode fazer teologia com um jornal na mão (tempo) e a Escritura (eterno) na outra. Seu trabalho é elaborar esta síntese. Teologia é, assim, Quérigma: proclamação! Senão permanece como a teologia liberal, a idéia, pela idéia, sobre a idéia, sem confrontar a realidade, sem questionar, sem incomodar, ou seja, sem proclamar. A Bíblia, assim, torna-se aquilo que deve ser: Palavra de Deus ao mundo; na medida em que questiona seu ouvinte e o confronta, exigindo-lhe mudança ou engajamento. Pregar é, pois, chamar, conclamar, desafiar. A Palavra deve gerar uma crise e a crise de Deus neste mundo se dá por Jesus Cristo. No efêmero do Seu rosto humano, aparece a face oculta do Deus Vivo. Por isso o mundo o rejeitou e matou: rejeitou a Sua pregação, pois era por demais crítica, questionadora, revelando a miséria humana e chamado os homens à vontade divina.
Por seu turno, os fundamentalistas vão assemelhar-se aos liberais, pois fazem o caminho inverso ao proposto pela neo-ortodoxia: eles submetem a hermenêutica bíblica às categorias de verdade do modernismo, especialmente as de “fato histórico” e “fato científico”. E assim o fazem porque baseiam-se nos seguintes pressupostos: 1) O ser humano pode conhecer a verdade; 2) A verdade é conhecida; 3) O que a comunidade ou grupo confessa corresponde à verdade. Desse modo, acreditam que professam a verdade naquilo que afirmam, pois seguem o mesmo pensamento dos que dizem que a verdade encontra-se nas coisas e pode ser apreendida totalmente pela razão e, sendo todos racionais, todos podem chegar a este conhecimento. A isto denomina-se senso-comum: todos podemos experimentar, todos podemos observar e, por isso, todos podemos chegar às mesmas conclusões, visto que não há idéias prévias mas, somente, os fatos em si que só podem expressar uma única verdade. O conhecimento está ao alcance de qualquer pessoa, visto que não depende de nenhuma outra mediação (seja filosófica, seja científica, ou mesmo de idéias inatas): basta observar e deduzir.
Aqui está o grande problema da compreensão dos fundamentalistas que os aproximam dos liberais e os levam para longe da neo-ortodoxia: eles desprezam o que é, de fato, a Revelação Divina. Acreditam que ela está subserviente ao conhecimento científico. Deste modo, sua visão se estreita ao ponto de deificar o texto bíblico, pelo que jocosamente Karl Barth os acusa de fazer da Bíblia um “papa de papel”. A salutar compreensão neo-ortodoxa, que somente evoca o pensamento cristão mais básico, é a de que Deus se revela primordialmente em ações e palavras dirigidas ao seu propósito salvífico na vida e na história humana, ações e palavras estas que, só mais tarde, vão ser dispostas num relato escrito.
Desta forma, assegura-se a singularidade da Revelação Cristã e preserva-se um critério universal e insuperável para a ética: o Evento Cristo! Tanto em Barth, como em Tillich, Bultmann e, especialmente, em Bonhoeffer, Jesus Cristo, a plena Palavra de Deus, é o critério e a medida da ética cristã. E isso é universal e insuperável, não havendo o menor espaço para relativização. Ao contrario do liberalismo e do fundamentalismo, na neo-ortodoxia, portanto, a Revelação de Deus em Jesus Cristo é o único fundamento de fé e de prática, de doutrina e de ética para a Igreja. Mais ortodoxo? Impossível!

A vida e a obra de Wolfhart Pannenberg

José Luiz Martins Carvalho
Wolfhart Pannenberg é, certamente, o teólogo protestante que mais atenção dá à relação entre fé e razão na teologia contemporânea. Alguns de seus críticos o acusam de racionalista. Todavia, é necessário esclarecer que há grande diferença entre buscar dar razão à fé, que é o cerne do trabalho deste autor, e tentar racionalizar a fé. Para ele, o cristianismo deve sempre argumentar, sem nunca se furtar a prover respostas ao mundo através de um esforço conceitual.
Nascido em Berlim, na Alemanha, em 1928, ele foi criado numa família cristã, através da qual concebeu o compromisso com o estudo da teologia. Sua conversão, conforme ele próprio conta, não ocorreu a partir de uma experiência única, mas de uma série de experiências, cuja mais marcante ocorreu no início de janeiro de 1945, aos 16 anos, quando voltava a pé de uma aula de piano e, ao ver outro extraordinário pôr-do-sol, ele se tomou consciência de sua própria existência humilde e finita. Alguns meses antes, ele havia escapado por pouco de um bombardeio americano à cidade de Berlim durante a Segunda Guerra Mundial. Pannenberg assim narra sua posterior tomada de consciência deste acontecimento:
“Eu não sabia, à época, que 6 de janeiro era o Dia da Epifania, assim como não me dei conta de que naquele momento Jesus Cristo havia reivindicado a minha vida como uma testemunha da transfiguração deste mundo, iluminado pelo poder e julgado por sua glória. Mas aí começou um período de ânsia para entender o sentido da vida, e uma vez que a filosofia não parecia oferecer respostas para o final dessa busca, eu finalmente decidi provar a tradição cristã mais seriamente do que eu havia considerado antes.”
Mais tarde, Pannenberg estudou teologia e filosofia em Berlim, a partir de 1947. Neste período, tomou contato com a teologia de Karl Barth de quem se tornou admirador, especialmente de sua ênfase na soberania de Deus na sua revelação. Em 1950, ele foi à Basiléia para estudar à sombra do próprio Barth. Da influência do teólogo suíço, Pannenberg nunca se livrou completamente, seja como admirador, seja como crítico contumaz.
Depois deste período, Pannenberg foi completar seus estudos teológicos na Universidade de Heidelberg. Ali sedimentou suas relações com a filosofia e a história, especialmente sob a influência de seus professores Karl Löwithe Gerhard von Rad. O próprio Pannenberg explica essas influências em seu pensamento:
“Ao mesmo tempo, eu cheguei a entender que a história apresenta o aspecto do mundo de nossa experiência, a qual, de acordo com a fé judaica e cristã, revela a presença de Deus em sua criação. Nesta descoberta, eu muito devo às palestras de Karl Löwith sobre a radicação teológica das modernas filosofias da história, bem como à interpretação de Gerhard Von Rad do Antigo Testamento.”
Em Heidelberg, Pannenberg participou da organização de um círculo de teólogos para refletir acerca da realidade de Deus a partir da experiência histórica, da tradição, da exegese crítica e, também da reflexão filosófica e teológica. Este círculo entendeu que não existe nenhuma abordagem conceitual direta a Deus e nem de Deus à realidade humana, mas que a presença de Deus está escondida nas indicações da história. Para eles, “o mesmo Deus da revelação toma lugar na história e justamente os escritos bíblicos sugerem esta chave da solução para o problema da teologia fundamental”.
Como resultado de mais de dez anos de estudos e debates, o círculo de Heidelberg publicou em 1961 uma obra programática cujo título foi Revelação como História. Neste livro, “colaboravam, em matéria de ciências bíblicas, Rolf Rendtorffe Ulrich Wilckens; para as ciências históricas, Trutz Rendtorff; Pannenberg (…) assinava a introdução e a síntese conclusiva”. Esta obra reflete as idéias do grupo, já preconizadas por Pannenberg num importante artigo de 1959 intitulado Evento da salvação e história [Evento da Salvação e História].
Em Offenbarung als Geschichte [Revelação como História], Pannenberg apresenta o livro na introdução e escreve o último capítulo, sob o título “Dogmáticos da Doutrina da Revelação”, onde apresenta sete teses: Na primeira tese, apesar de admitir a presença de alguns exemplos contrários, ele afirma que, de um modo geral, na Bíblia a revelação aparece com uma natureza indireta. Na segunda, O Antigo Testamento afirma que o conhecimento de Deus primeiro vem no olhar para a sua ação na história, assim, o conhecimento divino é mediado pelas manifestações em cujo sentido é revelado o seu governo. Já na terceira tese, Pannenberg enfatiza novamente a importância do desenvolvimento da escatologia em Israel, cujas bases estão na universalização do conhecimento de Deus. Na quarta e última tese, o caráter ancipatório da revelação. Com o aparecimento e obra de Jesus, o aspecto central da expectativa judaica – a vinda do reino – é agora operada na revelação antecipatória do governo de Deus na pessoa e na história de Jesus.
Mais tarde, Pannenberg publicou sua Systematische Theologie [Teologia Sistemática], dando forma material às premissas levantadas em seus escritos metodológicos anteriores. Sobre isso, Stanley J. Grenzafirma:
“Em sua Teologia Sistemática, Pannenberg realiza o programa indicado em seus escritos metodológicos. Ele está tentando dar uma nova direção para a compreensão teológica, a fim de combater o que ele percebe ser uma ampla privatização das crenças religiosas, em geral, e da teologia, em particular. Para Pannenberg, ao contrário, a teologia é uma disciplina pública.”
A Systematische Theologie de Pannenberg possui duas importantes características que apontam para a idéia geral de todo conjunto de seu pensamento dogmático. A primeira refere-se ao fato de que Pannenberg deseja fazer uma “teologia pública”, para tanto sua teologia dogmática tem foco na razão. A segunda característica repousa no caráter escatológico do cristianismo que aponta para o eschaton e, assim, para a esperança. A integração destes dois temas, razãoe esperança, constitui-se na linha-mestra de seu pensamento como explica o próprio Pannenberg:
“O entendimento do kerygma foi justamente de adesão à fé. A obediência da fé em relação ao kerygma seria uma ilusória auto-salvação do homem se não fosse motivado pela compreensão e, se ela não significava ser conquistado pela verdade da mensagem.”
Em suma, o pensamento de Pannenberg pode está firmado sobre um tripé básico: razão, história e prolepse. A razão é o pressuposto central de seu programa teológico, que enfatiza a possibilidade de verificação e validação da verdade. A história é o método, a linguagem pela qual esta verificação encontra lugar. A prolepse é a resposta que carrega em si o significado da antecipação histórica do futuro escatológico do mundo e da humanidade na ressurreição de Cristo.
Cf. FRAIJÓ, Manuel. El Sentido de la Historia, p. 14.
Cf. PANNENBERG, Wolfhart. God’s Presence in History. In: Christian Century, 11 de Março, 1981, p. 260.
PANNENBERG, Wolfhart. God’s Presence in History. In: Christian Century, 11 de Março, 1981, p. 260.
Cf. PANNENBERG, Wolfhart. God’s Presence in History. In: Christian Century, 11 de Março, 1981, p. 261.
Karl Löwith (1897-1973), filósofo judeu alemão, que refletiu exaustivamente acerca da filosofia da história, com especial atenção para as influências da cosmovisão judaico-cristã sobre o moderno conceito de História.
PANNENBERG, Wolfhart. God’s Presence in History. In: Christian Century, 11 de Março, 1981, p. 262.
Cf. PANNENBERG, Wolfhart. God’s Presence in History. In: Christian Century, 11 de Março, 1981, p. 260.
Rolf Rendtorff (1925-), exegeta e teólogo alemão, foi contemporâneo de Pannenberg na Universidade de Heidelberg e colaborador do grupo de jovens teólogos que participaram do chamado “círculo de Heidelberg”, que produziu o manifesto programático Offenbarung als Geschichte. Mais tarde, substituiu Gerhard von Rad na cátedra de Antigo Testamento daquela universidade. Atualmente, dedica-se ao estudo do AT e suas relações com o judaísmo.
GIBELLINI, Rosino. A Teologia do Século XX, p. 271.
PANNENBERG, Wolfhart. Dogmatic Theses on the Doctrine of Revelation. In: PANNENBERG, Wolfhart (Org.). Revelation as History, p. 125ss.
Stanley J. Grenz (1950-2005), teólogo batista norte-americano, foi orientado por Wolfhart Pannenberg em seu doutorado na Universidade de Munich, na Alemanha. Desde então, tornou-se um dos maiores conhecedores e divulgadores do pensamento de Pannenberg em língua inglesa.
GRENZ, Stanley J. Reason for Hope, p. 6-7.
Cf. GRENZ, Stanley J. Reason for Hope, p. 8-9.
PANNENBERG, Wolfhart. Basic Question in Theology, Vol. 2, p. 52-53.
Cf. SHULTS, F. LeRon. The Postfoundationalist Task of Theology, p. 84s.

Rudolf Bultmann

1. O debate a respeito da demitização (1941-1952)
Rudolf Bultmann (1884-1976) foi professor na Universidade de Marburg e participou das disputas teológicas no período da Teologia Dialética. Em 1941, apresentou sua palestra Novo Testamento e mitologia ou Manifesto da demitização. Este Manifesto, que teve quatro diferentes redações entre 1941-1952, questionava acerca do que o NT tem a dizer ao homem moderno.
Bultmann acredita que o discurso do NT é mitológico e não pode ser proposta ao homem de hoje: “Não podemos utilizar a luz elétrica e o rádio, ou, em caso de doença, recorrer às modernas descobertas médicas e clínicas e, ao mesmo tempo, acreditar no mundo dos espíritos e dos milagres que o NT propõe.”
Há um abismo entre a cosmovisão mitológica do NT e a do cosmovisão científica mundo modeno. A mensagem do NT é expressa em linguagem coerente com a antiga imagem mítica do mundo: Encarnação de um ser preexistente; Morte expiatória; Ressurreição; Descida aos infernos; Ascensão ao céu; Retorno no final dos tempos; Escatologia dos acontecimentos finais; é tudo produto de uma visão mitológica de mundo! A proposta de Bultmann, então, é: “Portanto, se o anúncio do Novo Testamento deve conservar uma validade própria, não há outra saída senão demitizá-lo.”
Bultmann identifica uma dupla tarefa na demitização: a) NEGATIVA: é a crítica da imagem de mundo expressa no mito; b) POSITIVA: é o esclarecimento da verdadeira intenção do mito. Estas duas tarefas, a crítica e o esclarecimento, se unem na tarefa hermenêutica, na interpretação das Escrituras. Demitizar, portanto, não consiste em eliminar o mito, como fez a teologia liberal, mas em interpretá-lo numa perspectiva antropológica/existencial, que ainda é capaz de falar ao homem de hoje.
Os críticos apontaram equívocos diversos no trabalho de Bultmann: Oscar Culmann o acusou de demitizar o que não deveria, isto é, os fatos da história; Karl Barth disse que ele errou ao comprometer o NT com o existencialismo de Heidegger; Karl Jaspers o criticou por absolutizar a ciência moderna e a visão iluminista acerca do mito, que era extremamente negativa.
2. R. Bultmann: Crer e compreender (1933-1965)
Em sua mais significativa obra, os quatro volumes de ensaios de teologia sistemática Crer e compreender, Bultmann apresenta a reflexão teológica dos pressupostos hermenêuticos apresentados no Manifesto. Para ele, a Palavra de Deus é Querigma, apelo à decisão; acolhê-la é compreender a si mesmo de modo radicalmente novo! A teologia cristã fala deDeus, mas não sobre Deus! Ele não é o objeto da teologia, mas sim sua revelação. Ela é a base para o discurso teológico. Assim, falar de Deus significa ao mesmo tempo falar do homem. A teologia fala de Deus para o homem: “Podemos falar dele [de Deus] somente na medida em que falamos de sua palavra dirigida a nós, de sua ação a nós dirigida.”
Heidegger e Bultmann:
Mas, como falar do homem? Bultmann encontrou na filosofia existencial de Heiddeger um instrumento que considerou adequado para falar das estruturas da existência humana. Para Heidegger, o ser do homem é existência, ex-sistere, um ser-fora-de-si, um ser-além, que o homem busca em suas decisões e ações. É um poder decidir-se, poder-ser. Nesta busca, o homem pode orientar-se e decidir-se de acordo com duas modalidades, dois modos diferentes de compreender-se e decidir-se: a) EXISTÊNCIA INAUTÊNTICA: no nível do mundo, das coisas, fuga de si; b) EXISTÊNCIA AUTÊNTICA: no nível de si mesmo, da aceitação de si;
Existência autêntica na fé:
Bultmann aplicou essas categorias à fé cristã: a) EXISTÊNCIA INAUTÊNTICA:é o pecado, viver por conta própria; b) EXISTÊNCIA AUTÊNTICA: é a fé, o abandono a Deus; A existência autêntica de acordo com a analítica de Heidegger, ainda continuava a ser existência inautêntica para o NT, segundo Bultmann. A existência autêntica não está centrada no pode do homem, mas em Deus e em sua Palavra. Aindaque a filosofia de Heidegger seja a melhor, para Bultmann, ela pode apenas analisar as estruturas formais da existência, mas não pode resolver o problema. Somente a Palavra de Deus anunciada e ouvida na fé pode realizar esta tarefa.
O Querigma:
Querigma é uma palavra grega que vem significar a proclamação de um decreto autorizado. Para Bultmann, a Palavra de Deus é querigma: “É a palavra que tem poder, que é eficaz. Ser pronunciada é essencial para essa palavra. Ela é anunciada e deve ser ouvida. É diretriz a ser seguida; ordem a ser observada.” É a palavra que interpela, é apelo! O evento da salvação é o evento da palavra, isto é, a salvação chega ao homem na proclamação da palavra interpelante do querigma e na sua acolhida dessa pela fé. A Igreja é o lugar da palavra, pois é mediante a Igreja e os seus mensageiros que ela é pregada. Assim, a Igreja fundamenta-se no evento da salvação/evento da palavra!
O Evento Cristo:
Mas qual é o conteúdo do querigma? O evento da salvação é o evento Cristo, por isso, o conteúdo do querigma é Cristo! Há dois modos de entender a iniciativa salvífica de Deus em Cristo: a) MODO OBJETIVO: ela se atualiza em acontecimento da história, que atingem o seu clímax na ressurreição de Cristo; b) MODO EXISTENCIAL: ela se atualiza no concreto encontro com a Palavra de Deus e na renovação da existência. É evento da salvação para mim. O conteúdo do Querigma, portanto, é a pregação da Igreja, o anúncio cristão, onde se confessa Jesus como o Cristo, e não Palavra de Jesus. Ele não diz respeito ao Jesus Histórico, mas à mensagem de que Jesus é o Cristo.
História e Escatologia:
Em que consiste, então, a esperança cristã? Qual a relação entre escatologia e história? Segundo Bultmann, o AT não conhece a doutrina do fim da história. A escatologia é uma novidade da literatura apocalíptica, fruto do judaísmo tardio. Mundo onde nasceu o cristianismo primitivo. Paulo e João superaram esta visão, historicizando a escatologia, que não se dará num grande evento cósmico, mas começa com o aparecimento de Jesus Cristo e se repete infinitas vezes na história. Escatológico, então, é o que é decisivo para a existência! A esperança cristã consiste na crença no futuro de Deus como cumprimento da vida humana.
Barth e Bultmann:
A teologia de Bultmann é produto da aplicação da interpretação existencial ao NT. Outros também a utilizaram, mas não com importância Bultmann lhe deu. Barth foi um dos maiores e mais importantes críticos. Em sua Dogmática Eclesial, ele contrapõe a Bultmann com uma compreensão trinitária da revelação: Estas [as afirmações de fé]dizem respeito a toda a existência humana. Possibilitam e fundamentam sua compreensão cristã, e tornam-se assim – transformadas – também determinações da existência cristã. Mas não são originariamente isso. Originariamente elas designam o ser e o agir de Deus, do Deus que é diferente do homem e vem ao encontro desse homem: do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Não devem, pois, ser reduzidas a afirmações a respeito da vida interior do homem. Bultmann, ao contrário, defendia uma concepção antropológico-existencial para a revelação.

3. Nova pesquisa do Jesus Histórico (1953-1964)
A obra de Bultmman reacendeu a pesquisa sobre o Jesus Histórico que terminara no início do século XX (1906), com a publicação da obra de Albert Schweitzer. Na época de Bultmann, dois fatos novos, com os quais ele esteve envolvido, propiciam o renascimento desta questão: a) A teologia dialética rompendo com a teologia liberal; b) O novo método de crítica bíblica: a história das formas.
Bultmann se interessa por pesquisas historiográficas sobre Jesus, mas elas não são tão relevantes para a fé. Relevante é o Cristo da Fé. Para ele, o Cristianismo começa com a experiência da Páscoa e o querigma da igreja, isto é, com o anúncio da fé em Cristo.
Posições e resultados da nova pesquisa:
a) Bultmann insistiu numa teologia existencial: o cristianismo nasce com a fé pascal, com o querigma que a comunidade primitiva confessa. Há continuidade, mas não concordânciacom o Jesus Histórico.
b) Os discípulos de Bultmann reconstruíram uma ponte entre o Jesus Histórico e o querigma da igreja, uma unidade objetiva. O querigma carrega em si o Jesus Histórico.
c) Os teólogos não-bultmannianos traçaram uma via histórica mais ampla. Eles confiam mais na pesquisa histórica, estando interessados em delinear mais uma figura dos traços essenciais de Jesus, do que uma ligação entre o Jesus Histórico e o Cristo do NT.
Entre historicismo e existencialismo:
O resultado da controvérsia foi, de um lado, a assimilação dos modernos métodos histórico-críticos, em um número cada vez maior de teólogos, tanto protestantes como católicos; e, de outro, a individuação de uma via histórica para remontar do Cristo do NT ao Jesus histórico.
a) A Old Quest [Antiga Busca] movia-se no terreno histórico, perdendo de vista o aspecto teológico.
b) A posição de Bultmann movia-se firmemente no terreno existencial, perdendo de vista a relevância teológica do aspecto histórico.
c) A New Quest [Nova Busca] pôs as premissas para a elaboração de uma teologia histórica.

Uma Defesa do Calvinismo

É uma grande coisa já começar a vida Cristã crendo em boa e sólida doutrina. Algumas pessoas têm recebido vinte diferentes "evangelhos" neste mesmo número de anos; e quantos mais irão aceitar antes que sua jornada termine é difícil de dizer. Dou graças a Deus por Ele logo cedo ter me ensinado o evangelho, e tenho estado tão perfeitamente satisfeito com ele, que não quero conhecer nenhum outro.

Porque, se eu cresse no que alguns pregam sobre uma salvação temporária, e sem importância, que somente dura por um tempo, eu raramente seria grato por ela, se é que seria; mas quando sei que aqueles que Deus salva, Ele os salva com uma salvação eterna, quando sei que Ele lhes dá uma justiça eterna, quando eu sei que Ele os assenta em uma fundação eterna de amor eterno, e que Ele os trará ao Seu reino eterno, oh, então me admiro, e me surpreendo pelo fato de uma bênção tal como esta tenha, em algum momento, sido dada a mim!

Suponho que haja algumas pessoas cujas mentes naturalmente se inclinam em direção à doutrina do livre-arbítrio. Eu posso somente dizer que a minha se inclina naturalmente em direção à doutrina da graça soberana. Algumas vezes, quando vejo algumas das piores personalidades na rua, eu sinto como se meu coração devesse jorrar em lágrimas de gratidão, porque se Deus me tivesse deixado só e não me tivesse tocado por Sua graça, que grande pecador eu teria sido! Eu teria ido aos extremos do pecado, mergulhado nas maiores profundezas do mal, também não teria reprimido qualquer vício ou loucura se Deus não me tivesse restringido. Eu sinto que eu teria sido o próprio rei dos pecadores, se Deus me tivesse deixado só.

Eu não consigo entender a razão pela qual sou salvo, exceto sobre a base de que Deus queria que isto fosse assim. Eu não posso, se olhar sinceramente, descobrir qualquer tipo de razão em mim mesmo pela qual eu deva ser um participante da graça Divina. Se não estou neste momento sem Cristo, é somente porque Cristo Jesus tem Sua vontade para comigo, e que esta vontade é que eu deveria estar com Ele onde Ele estiver, e que deveria partilhar da Sua glória. Não posso por a coroa em nenhum outro lugar exceto sobre a cabeça Daquele cuja poderosa graça tem me salvado de seguir abaixo para o abismo. Foi Ele que transformou meu coração, e me colocou de joelhos diante de Si.

Posso bem me lembrar da maneira pela qual eu aprendi as doutrinas da graça em um único instante. Nascido, como todos nós somos por natureza, um arminiano, ainda cria nas velhas coisas que tinha ouvido continuamente do púlpito, e não via a graça de Deus. Quando estava vindo a Cristo, pensei estar fazendo aquilo tudo por mim mesmo, e ainda que buscasse o Senhor sinceramente, não tinha idéia de que o Senhor estava me buscando. Não penso que o novo convertido esteja, a princípio, consciente disto. Eu posso relembrar o dia e a hora exatos em que pela primeira vez recebi aquelas verdades em minha própria alma, quando elas foram, como diz John Bunyan, gravadas em meu coração como com um ferro em brasa; e eu posso recompor como me senti quando cresci repentinamente de um bebê para um homem que havia feito progressos no conhecimento das Escrituras, por ter encontrado, de uma vez por todas, a chave para a verdade de Deus.

Em uma noite de um dia de semana, quando estava sentado na casa de Deus, não estava pensando muito sobre o sermão do pregador, porque não cria nele. Um pensamento me tocou: "Como você veio a ser um Cristão?" Eu vi o Senhor. "Mas como você veio a buscar o Senhor?" A verdade lampejou por minha mente em um momento, eu não poderia tê-lo buscado a menos que tivesse havido alguma influência prévia em minha mente para me fazer buscá-Lo. Eu orei, pensei eu, mas quando perguntei a mim mesmo, como eu vim a orar? Fui induzido a orar pela leitura das Escrituras. Como eu vim a ler as Escrituras? Eu as havia lido, mas o que me levou a assim proceder? Então em um instante, eu vi que Deus estava na base disto tudo, e que Ele foi o Autor da minha fé, e assim toda a doutrina da graça se tornou acessível a mim, e desta doutrina eu não me afastei até hoje, e desejo fazer desta, a minha confissão perpétua: "Eu atribuo minha conversão inteiramente a Deus".

Certa vez compareci a um culto aonde o texto veio a ser: "[Ele] escolherá para nós a nossa herança"1 e o bom homem que ocupou o púlpito era mais do que apenas um pouco arminiano. Por esta razão, quando começou, ele disse: "Esta passagem se refere inteiramente à nossa herança temporal, não tem nada a ver com nosso destino eterno, porque", disse ele, "nós não queremos que Cristo faça por nós a escolha do Céu ou do inferno. Isto é tão claro e direto, que cada homem que tenha um grão de senso comum irá escolher o Céu, e nenhuma pessoa será tão desajuizada que escolha o inferno. Não temos qualquer necessidade de alguma inteligência superior, ou de qualquer grande Ser, para escolher Céu ou inferno por nós. Isto é deixado para o nosso próprio livre-arbítrio, e temos bastante sabedoria dando-nos meios suficientemente corretos para julgar por nós mesmos," e, portanto, como ele muito logicamente inferiu, não há necessidade de Jesus Cristo, ou de qualquer outro, fazer a escolha por nós. Nós podemos escolher a herança por nós mesmos sem qualquer assistência. "Ah!" eu pensei, "mas, meu bom irmão, pode ser mesmo verdade que nós podemos, mas penso que precisamos querer algo mais que o senso comum antes que possamos escolher corretamente".

Primeiro, deixe-me perguntar, não devemos todos nós admitir uma soberana Providência, e a designação da mão do SENHOR, como os meios através dos quais nós viemos a este mundo? Aqueles homens que pensam que, depois de tudo, nós somos deixados ao nosso próprio livre-arbítrio para escolher este ou aquele para direcionar os nossos passos, deve admitir que nossa entrada neste mundo não aconteceu por nossa própria vontade, mas que Deus teve, naquela hora, que escolher por nós. Que circunstâncias foram aquelas, sob de nosso controle, que nos direcionaram a eleger certas pessoas como sendo nossos pais? Tivemos nós alguma coisa a ver com isto? Não foi o próprio Deus que determinou nossos pais, nosso local de nascimento, e amigos?

John Newton costumava contar uma parábola sobre uma boa mulher que, de modo a provar a doutrina da eleição, dizia: "Ah! meu caro, o Senhor deve ter me amado antes de eu nascer, ou caso contrário Ele não teria visto nada em mim para amar depois". Estou certo que é verdade no meu caso; Eu creio na doutrina da eleição, porque estou bem certo que, se Deus não me tivesse escolhido, eu nunca O teria escolhido; e tenho certeza que Ele me escolheu antes de eu nascer, ou caso contrário Ele nunca teria me escolhido depois; e Ele deve ter me eleito por razões desconhecidas por mim, porque eu nunca pude encontrar qualquer razão em mim mesmo pela qual Ele devesse me olhar com especial amor.

Se seria admirável ver um rio brotar da terra já crescido, tanto mais seria olhar pasmado para uma vasta fonte da qual todos os rios da terra saíssem borbulhando de uma só vez; um milhão deles nascendo em um só nascimento? Que visão haveria de ser! Quem pode concebê-la. E ainda assim o amor de Deus é aquela fonte, formando cada um dos rios de misericórdia, os quais têm sempre satisfeito nosso povo com todos os rios de graça durante o tempo, e de glória depois de subirem. Minh'alma, permaneça naquele manancial sagrado, e adore e exalte para todo o sempre a Deus, nosso Pai, que tem nos amado! Bem no início, quando este grande universo estava na mente de Deus, como florestas não nascidas na semente do carvalho; muito antes que os ecos acordassem os ermos; antes que as montanhas fossem geradas; e muito antes que a luz rompesse pelo céu, Deus amou estas criaturas escolhidas. Antes que houvesse qualquer ser criado, quando o éter ainda não havia sido agitado pelas asas do anjos, quando o próprio espaço ainda não tinha existência, quando não havia nada exceto Deus somente, mesmo então, naquela solidão de Deidade, e naquela penetrante quietude e profundidade, Seu coração se moveu com amor por seus escolhidos. Seus nomes estavam escritos em Seu coração, e então eram eles queridos de Sua alma. Jesus amou Seu povo antes da fundação do mundo, mesmo da eternidade! E quando Ele me chamou por Sua graça, me disse: "Porquanto com amor eterno te amei, por isso com benignidade te atraí"2.

Se qualquer um me perguntasse o que eu entendo por um Calvinista, eu responderia: "Ele é alguém que diz: Salvação do Senhor". Eu não consigo encontrar nas Escrituras nenhuma outra doutrina além desta. É a essência da Bíblia. "Só ele é a minha rocha e a minha salvação"3. Me diga qualquer coisa contrária a esta verdade, e será uma heresia; diga-me uma heresia, e eu acharei sua essência aqui: que ela se afastou desta grande, desta fundamental, desta firme verdade, "Deus é minha rocha e minha salvação".

Qual é a heresia de Roma, além da adição de algo aos perfeitos méritos de Jesus Cristo, o acréscimo de obras da carne, para auxiliar em nossa justificação? E qual é a heresia do arminianismo além de adicionar algo à obra do Redentor? Cada heresia, se trazida à pedra de toque, irá se descobrir aqui.

Eu tenho minha própria opinião particular de que não há tal coisa como pregar Cristo e Ele crucificado, a menos que nós preguemos que nos dias de hoje isto é chamado de Calvinismo. É um apelido chamar a isto de Calvinismo; o Calvinismo é o evangelho, e nada mais. Eu não creio que podemos pregar o evangelho, se não pregarmos a justificação pela fé, sem obras; nem sem pregarmos a soberania de Deus e Sua dispensação de graça; nem sem exaltarmos a eleição, pelo inalterável, eterno, imutável, conquistador amor do SENHOR; nem penso que podemos pregar o evangelho, a menos que o baseemos sobre a especial e particular redenção de Seu povo eleito e escolhido o qual Cristo formou sobre a cruz; nem posso eu compreender um evangelho que deixa santos decaírem após serem chamados, e sujeitar os filhos de Deus a serem queimados no fogo da condenação após terem uma vez crido em Jesus. Tal evangelho eu abomino.

Não há alma viva que defenda mais firmemente as doutrinas da graça que eu, e se algum homem me pergunta se porventura me envergonho de ser chamado Calvinista, respondo que eu não quero ser chamado de nada além de Cristão; mas se você me perguntar, eu defendo a visão doutrinária que foi defendida por João Calvino, eu replico, estou no centro de sua defesa, e estou feliz por professá-la.

Mas, longe de mim, sequer imaginar que Sião não contém nada além de Cristãos Calvinistas dentro de seus muros, ou que não há ninguém salvo que não defenda nossa visão. Creio que há multidões de homens que não conseguem ver estas verdades, ou, pelo menos, não conseguem vê-las do modo em que nós as colocamos, mas que não obstante, têm recebido a Cristo como seu Salvador, e são tão queridos do coração do Deus de graça como o mais ruidoso Calvinista dentro ou fora do Céu.

Frequentemente é dito que estas doutrinas nas quais nós cremos têm uma tendência de nos levar ao pecado. Eu tenho ouvido isto ser declarado muito positivamente: que aquelas grandes doutrinas que amamos, e que encontramos nas Escrituras, são licenciosas. Não sei quem terá a audácia de fazer esta afirmação, quando considerar que os mais santos dentre os homens têm crido nelas. Pergunto ao homem que se atreve a dizer que o Calvinismo é uma religião licenciosa, o que ele pensa do caráter de Agostinho, ou de Calvino, ou de Whitefield, que em sucessivas eras foram grandes expoentes do sistema da graça; ou o que diria dos Puritanos, cujas obras estão cheias delas? Se um homem tivesse sido um Arminiano naqueles dias, teria sido considerado o mais vil herege vivente, mas agora nós somos vistos como hereges, e eles como ortodoxos.

Nós temos retornado à velha escola; nós podemos traçar nossa linhagem desde os apóstolos. É aquele veio de livre-graça, correndo através da pregação de Batistas, os quais nos têm salvado como denominação. Não é por isto que nós não podemos permanecer onde estamos hoje. Nós podemos correr uma linha dourada até o próprio Jesus Cristo, através de uma santa sucessão de vigorosos pais, todos os quais defenderam estas gloriosas verdades; e podemos perguntar a seu respeito: "Onde você encontraria homens melhores e mais consagrados no mundo?". Nenhuma doutrina é tão planejada para preservar o homem do pecado quanto a doutrina da graça de Deus. Aqueles que a têm chamado de "doutrina licenciosa" não sabem nada a seu respeito. Coisas pobres da ignorância, eles mal souberam que seu próprio material ruim foi a mais licenciosa doutrina sob o céu. Se eles conhecessem a graça de Deus em verdade, eles logo iriam ver que não houve nada que preservasse mais da queda que o conhecimento de que somos eleitos de Deus desde a fundação do mundo. Não há nada como a crença na perseverança eterna, e na imutabilidade da afeição de meu Pai, que possa me manter mais perto Dele, pela simples razão da gratidão. Nada faz um homem mais virtuoso que a crença na verdade. Uma mentira doutrinária irá logo produzir uma prática mentirosa. Um homem não pode ter uma crença errada sem em algum momento futuro ter uma vida errônea. Eu creio que uma coisa naturalmente leva à outra.

De todos os homens, os que têm a mais desinteressada piedade, a mais sublime reverência, a mais ardente devoção, são aqueles que crêem que são salvos pela graça, sem obras, através da fé, e não de si mesmos, a qual é dom de Deus.4

Os Cristãos devem ter cautela, e ver que isto sempre é assim, a fim de que por quaisquer meios Cristo não seja novamente crucificado, e exposto ao vitupério5.

1 Salmo 47:4
2 Jeremias 31:3
3 Salmo 62:6
4 Efésios 2:8-9
5 Hebreus 6:6

Uma Defesa do Calvinismo

É uma grande coisa já começar a vida Cristã crendo em boa e sólida doutrina. Algumas pessoas têm recebido vinte diferentes "evangelhos" neste mesmo número de anos; e quantos mais irão aceitar antes que sua jornada termine é difícil de dizer. Dou graças a Deus por Ele logo cedo ter me ensinado o evangelho, e tenho estado tão perfeitamente satisfeito com ele, que não quero conhecer nenhum outro.

Porque, se eu cresse no que alguns pregam sobre uma salvação temporária, e sem importância, que somente dura por um tempo, eu raramente seria grato por ela, se é que seria; mas quando sei que aqueles que Deus salva, Ele os salva com uma salvação eterna, quando sei que Ele lhes dá uma justiça eterna, quando eu sei que Ele os assenta em uma fundação eterna de amor eterno, e que Ele os trará ao Seu reino eterno, oh, então me admiro, e me surpreendo pelo fato de uma bênção tal como esta tenha, em algum momento, sido dada a mim!

Suponho que haja algumas pessoas cujas mentes naturalmente se inclinam em direção à doutrina do livre-arbítrio. Eu posso somente dizer que a minha se inclina naturalmente em direção à doutrina da graça soberana. Algumas vezes, quando vejo algumas das piores personalidades na rua, eu sinto como se meu coração devesse jorrar em lágrimas de gratidão, porque se Deus me tivesse deixado só e não me tivesse tocado por Sua graça, que grande pecador eu teria sido! Eu teria ido aos extremos do pecado, mergulhado nas maiores profundezas do mal, também não teria reprimido qualquer vício ou loucura se Deus não me tivesse restringido. Eu sinto que eu teria sido o próprio rei dos pecadores, se Deus me tivesse deixado só.

Eu não consigo entender a razão pela qual sou salvo, exceto sobre a base de que Deus queria que isto fosse assim. Eu não posso, se olhar sinceramente, descobrir qualquer tipo de razão em mim mesmo pela qual eu deva ser um participante da graça Divina. Se não estou neste momento sem Cristo, é somente porque Cristo Jesus tem Sua vontade para comigo, e que esta vontade é que eu deveria estar com Ele onde Ele estiver, e que deveria partilhar da Sua glória. Não posso por a coroa em nenhum outro lugar exceto sobre a cabeça Daquele cuja poderosa graça tem me salvado de seguir abaixo para o abismo. Foi Ele que transformou meu coração, e me colocou de joelhos diante de Si.

Posso bem me lembrar da maneira pela qual eu aprendi as doutrinas da graça em um único instante. Nascido, como todos nós somos por natureza, um arminiano, ainda cria nas velhas coisas que tinha ouvido continuamente do púlpito, e não via a graça de Deus. Quando estava vindo a Cristo, pensei estar fazendo aquilo tudo por mim mesmo, e ainda que buscasse o Senhor sinceramente, não tinha idéia de que o Senhor estava me buscando. Não penso que o novo convertido esteja, a princípio, consciente disto. Eu posso relembrar o dia e a hora exatos em que pela primeira vez recebi aquelas verdades em minha própria alma, quando elas foram, como diz John Bunyan, gravadas em meu coração como com um ferro em brasa; e eu posso recompor como me senti quando cresci repentinamente de um bebê para um homem que havia feito progressos no conhecimento das Escrituras, por ter encontrado, de uma vez por todas, a chave para a verdade de Deus.

Em uma noite de um dia de semana, quando estava sentado na casa de Deus, não estava pensando muito sobre o sermão do pregador, porque não cria nele. Um pensamento me tocou: "Como você veio a ser um Cristão?" Eu vi o Senhor. "Mas como você veio a buscar o Senhor?" A verdade lampejou por minha mente em um momento, eu não poderia tê-lo buscado a menos que tivesse havido alguma influência prévia em minha mente para me fazer buscá-Lo. Eu orei, pensei eu, mas quando perguntei a mim mesmo, como eu vim a orar? Fui induzido a orar pela leitura das Escrituras. Como eu vim a ler as Escrituras? Eu as havia lido, mas o que me levou a assim proceder? Então em um instante, eu vi que Deus estava na base disto tudo, e que Ele foi o Autor da minha fé, e assim toda a doutrina da graça se tornou acessível a mim, e desta doutrina eu não me afastei até hoje, e desejo fazer desta, a minha confissão perpétua: "Eu atribuo minha conversão inteiramente a Deus".

Certa vez compareci a um culto aonde o texto veio a ser: "[Ele] escolherá para nós a nossa herança"1 e o bom homem que ocupou o púlpito era mais do que apenas um pouco arminiano. Por esta razão, quando começou, ele disse: "Esta passagem se refere inteiramente à nossa herança temporal, não tem nada a ver com nosso destino eterno, porque", disse ele, "nós não queremos que Cristo faça por nós a escolha do Céu ou do inferno. Isto é tão claro e direto, que cada homem que tenha um grão de senso comum irá escolher o Céu, e nenhuma pessoa será tão desajuizada que escolha o inferno. Não temos qualquer necessidade de alguma inteligência superior, ou de qualquer grande Ser, para escolher Céu ou inferno por nós. Isto é deixado para o nosso próprio livre-arbítrio, e temos bastante sabedoria dando-nos meios suficientemente corretos para julgar por nós mesmos," e, portanto, como ele muito logicamente inferiu, não há necessidade de Jesus Cristo, ou de qualquer outro, fazer a escolha por nós. Nós podemos escolher a herança por nós mesmos sem qualquer assistência. "Ah!" eu pensei, "mas, meu bom irmão, pode ser mesmo verdade que nós podemos, mas penso que precisamos querer algo mais que o senso comum antes que possamos escolher corretamente".

Primeiro, deixe-me perguntar, não devemos todos nós admitir uma soberana Providência, e a designação da mão do SENHOR, como os meios através dos quais nós viemos a este mundo? Aqueles homens que pensam que, depois de tudo, nós somos deixados ao nosso próprio livre-arbítrio para escolher este ou aquele para direcionar os nossos passos, deve admitir que nossa entrada neste mundo não aconteceu por nossa própria vontade, mas que Deus teve, naquela hora, que escolher por nós. Que circunstâncias foram aquelas, sob de nosso controle, que nos direcionaram a eleger certas pessoas como sendo nossos pais? Tivemos nós alguma coisa a ver com isto? Não foi o próprio Deus que determinou nossos pais, nosso local de nascimento, e amigos?

John Newton costumava contar uma parábola sobre uma boa mulher que, de modo a provar a doutrina da eleição, dizia: "Ah! meu caro, o Senhor deve ter me amado antes de eu nascer, ou caso contrário Ele não teria visto nada em mim para amar depois". Estou certo que é verdade no meu caso; Eu creio na doutrina da eleição, porque estou bem certo que, se Deus não me tivesse escolhido, eu nunca O teria escolhido; e tenho certeza que Ele me escolheu antes de eu nascer, ou caso contrário Ele nunca teria me escolhido depois; e Ele deve ter me eleito por razões desconhecidas por mim, porque eu nunca pude encontrar qualquer razão em mim mesmo pela qual Ele devesse me olhar com especial amor.

Se seria admirável ver um rio brotar da terra já crescido, tanto mais seria olhar pasmado para uma vasta fonte da qual todos os rios da terra saíssem borbulhando de uma só vez; um milhão deles nascendo em um só nascimento? Que visão haveria de ser! Quem pode concebê-la. E ainda assim o amor de Deus é aquela fonte, formando cada um dos rios de misericórdia, os quais têm sempre satisfeito nosso povo com todos os rios de graça durante o tempo, e de glória depois de subirem. Minh'alma, permaneça naquele manancial sagrado, e adore e exalte para todo o sempre a Deus, nosso Pai, que tem nos amado! Bem no início, quando este grande universo estava na mente de Deus, como florestas não nascidas na semente do carvalho; muito antes que os ecos acordassem os ermos; antes que as montanhas fossem geradas; e muito antes que a luz rompesse pelo céu, Deus amou estas criaturas escolhidas. Antes que houvesse qualquer ser criado, quando o éter ainda não havia sido agitado pelas asas do anjos, quando o próprio espaço ainda não tinha existência, quando não havia nada exceto Deus somente, mesmo então, naquela solidão de Deidade, e naquela penetrante quietude e profundidade, Seu coração se moveu com amor por seus escolhidos. Seus nomes estavam escritos em Seu coração, e então eram eles queridos de Sua alma. Jesus amou Seu povo antes da fundação do mundo, mesmo da eternidade! E quando Ele me chamou por Sua graça, me disse: "Porquanto com amor eterno te amei, por isso com benignidade te atraí"2.

Se qualquer um me perguntasse o que eu entendo por um Calvinista, eu responderia: "Ele é alguém que diz: Salvação do Senhor". Eu não consigo encontrar nas Escrituras nenhuma outra doutrina além desta. É a essência da Bíblia. "Só ele é a minha rocha e a minha salvação"3. Me diga qualquer coisa contrária a esta verdade, e será uma heresia; diga-me uma heresia, e eu acharei sua essência aqui: que ela se afastou desta grande, desta fundamental, desta firme verdade, "Deus é minha rocha e minha salvação".

Qual é a heresia de Roma, além da adição de algo aos perfeitos méritos de Jesus Cristo, o acréscimo de obras da carne, para auxiliar em nossa justificação? E qual é a heresia do arminianismo além de adicionar algo à obra do Redentor? Cada heresia, se trazida à pedra de toque, irá se descobrir aqui.

Eu tenho minha própria opinião particular de que não há tal coisa como pregar Cristo e Ele crucificado, a menos que nós preguemos que nos dias de hoje isto é chamado de Calvinismo. É um apelido chamar a isto de Calvinismo; o Calvinismo é o evangelho, e nada mais. Eu não creio que podemos pregar o evangelho, se não pregarmos a justificação pela fé, sem obras; nem sem pregarmos a soberania de Deus e Sua dispensação de graça; nem sem exaltarmos a eleição, pelo inalterável, eterno, imutável, conquistador amor do SENHOR; nem penso que podemos pregar o evangelho, a menos que o baseemos sobre a especial e particular redenção de Seu povo eleito e escolhido o qual Cristo formou sobre a cruz; nem posso eu compreender um evangelho que deixa santos decaírem após serem chamados, e sujeitar os filhos de Deus a serem queimados no fogo da condenação após terem uma vez crido em Jesus. Tal evangelho eu abomino.

Não há alma viva que defenda mais firmemente as doutrinas da graça que eu, e se algum homem me pergunta se porventura me envergonho de ser chamado Calvinista, respondo que eu não quero ser chamado de nada além de Cristão; mas se você me perguntar, eu defendo a visão doutrinária que foi defendida por João Calvino, eu replico, estou no centro de sua defesa, e estou feliz por professá-la.

Mas, longe de mim, sequer imaginar que Sião não contém nada além de Cristãos Calvinistas dentro de seus muros, ou que não há ninguém salvo que não defenda nossa visão. Creio que há multidões de homens que não conseguem ver estas verdades, ou, pelo menos, não conseguem vê-las do modo em que nós as colocamos, mas que não obstante, têm recebido a Cristo como seu Salvador, e são tão queridos do coração do Deus de graça como o mais ruidoso Calvinista dentro ou fora do Céu.

Frequentemente é dito que estas doutrinas nas quais nós cremos têm uma tendência de nos levar ao pecado. Eu tenho ouvido isto ser declarado muito positivamente: que aquelas grandes doutrinas que amamos, e que encontramos nas Escrituras, são licenciosas. Não sei quem terá a audácia de fazer esta afirmação, quando considerar que os mais santos dentre os homens têm crido nelas. Pergunto ao homem que se atreve a dizer que o Calvinismo é uma religião licenciosa, o que ele pensa do caráter de Agostinho, ou de Calvino, ou de Whitefield, que em sucessivas eras foram grandes expoentes do sistema da graça; ou o que diria dos Puritanos, cujas obras estão cheias delas? Se um homem tivesse sido um Arminiano naqueles dias, teria sido considerado o mais vil herege vivente, mas agora nós somos vistos como hereges, e eles como ortodoxos.

Nós temos retornado à velha escola; nós podemos traçar nossa linhagem desde os apóstolos. É aquele veio de livre-graça, correndo através da pregação de Batistas, os quais nos têm salvado como denominação. Não é por isto que nós não podemos permanecer onde estamos hoje. Nós podemos correr uma linha dourada até o próprio Jesus Cristo, através de uma santa sucessão de vigorosos pais, todos os quais defenderam estas gloriosas verdades; e podemos perguntar a seu respeito: "Onde você encontraria homens melhores e mais consagrados no mundo?". Nenhuma doutrina é tão planejada para preservar o homem do pecado quanto a doutrina da graça de Deus. Aqueles que a têm chamado de "doutrina licenciosa" não sabem nada a seu respeito. Coisas pobres da ignorância, eles mal souberam que seu próprio material ruim foi a mais licenciosa doutrina sob o céu. Se eles conhecessem a graça de Deus em verdade, eles logo iriam ver que não houve nada que preservasse mais da queda que o conhecimento de que somos eleitos de Deus desde a fundação do mundo. Não há nada como a crença na perseverança eterna, e na imutabilidade da afeição de meu Pai, que possa me manter mais perto Dele, pela simples razão da gratidão. Nada faz um homem mais virtuoso que a crença na verdade. Uma mentira doutrinária irá logo produzir uma prática mentirosa. Um homem não pode ter uma crença errada sem em algum momento futuro ter uma vida errônea. Eu creio que uma coisa naturalmente leva à outra.

De todos os homens, os que têm a mais desinteressada piedade, a mais sublime reverência, a mais ardente devoção, são aqueles que crêem que são salvos pela graça, sem obras, através da fé, e não de si mesmos, a qual é dom de Deus.4

Os Cristãos devem ter cautela, e ver que isto sempre é assim, a fim de que por quaisquer meios Cristo não seja novamente crucificado, e exposto ao vitupério5.

1 Salmo 47:4
2 Jeremias 31:3
3 Salmo 62:6
4 Efésios 2:8-9
5 Hebreus 6:6

Uma Defesa do Calvinismo

É uma grande coisa já começar a vida Cristã crendo em boa e sólida doutrina. Algumas pessoas têm recebido vinte diferentes "evangelhos" neste mesmo número de anos; e quantos mais irão aceitar antes que sua jornada termine é difícil de dizer. Dou graças a Deus por Ele logo cedo ter me ensinado o evangelho, e tenho estado tão perfeitamente satisfeito com ele, que não quero conhecer nenhum outro.

Porque, se eu cresse no que alguns pregam sobre uma salvação temporária, e sem importância, que somente dura por um tempo, eu raramente seria grato por ela, se é que seria; mas quando sei que aqueles que Deus salva, Ele os salva com uma salvação eterna, quando sei que Ele lhes dá uma justiça eterna, quando eu sei que Ele os assenta em uma fundação eterna de amor eterno, e que Ele os trará ao Seu reino eterno, oh, então me admiro, e me surpreendo pelo fato de uma bênção tal como esta tenha, em algum momento, sido dada a mim!

Suponho que haja algumas pessoas cujas mentes naturalmente se inclinam em direção à doutrina do livre-arbítrio. Eu posso somente dizer que a minha se inclina naturalmente em direção à doutrina da graça soberana. Algumas vezes, quando vejo algumas das piores personalidades na rua, eu sinto como se meu coração devesse jorrar em lágrimas de gratidão, porque se Deus me tivesse deixado só e não me tivesse tocado por Sua graça, que grande pecador eu teria sido! Eu teria ido aos extremos do pecado, mergulhado nas maiores profundezas do mal, também não teria reprimido qualquer vício ou loucura se Deus não me tivesse restringido. Eu sinto que eu teria sido o próprio rei dos pecadores, se Deus me tivesse deixado só.

Eu não consigo entender a razão pela qual sou salvo, exceto sobre a base de que Deus queria que isto fosse assim. Eu não posso, se olhar sinceramente, descobrir qualquer tipo de razão em mim mesmo pela qual eu deva ser um participante da graça Divina. Se não estou neste momento sem Cristo, é somente porque Cristo Jesus tem Sua vontade para comigo, e que esta vontade é que eu deveria estar com Ele onde Ele estiver, e que deveria partilhar da Sua glória. Não posso por a coroa em nenhum outro lugar exceto sobre a cabeça Daquele cuja poderosa graça tem me salvado de seguir abaixo para o abismo. Foi Ele que transformou meu coração, e me colocou de joelhos diante de Si.

Posso bem me lembrar da maneira pela qual eu aprendi as doutrinas da graça em um único instante. Nascido, como todos nós somos por natureza, um arminiano, ainda cria nas velhas coisas que tinha ouvido continuamente do púlpito, e não via a graça de Deus. Quando estava vindo a Cristo, pensei estar fazendo aquilo tudo por mim mesmo, e ainda que buscasse o Senhor sinceramente, não tinha idéia de que o Senhor estava me buscando. Não penso que o novo convertido esteja, a princípio, consciente disto. Eu posso relembrar o dia e a hora exatos em que pela primeira vez recebi aquelas verdades em minha própria alma, quando elas foram, como diz John Bunyan, gravadas em meu coração como com um ferro em brasa; e eu posso recompor como me senti quando cresci repentinamente de um bebê para um homem que havia feito progressos no conhecimento das Escrituras, por ter encontrado, de uma vez por todas, a chave para a verdade de Deus.

Em uma noite de um dia de semana, quando estava sentado na casa de Deus, não estava pensando muito sobre o sermão do pregador, porque não cria nele. Um pensamento me tocou: "Como você veio a ser um Cristão?" Eu vi o Senhor. "Mas como você veio a buscar o Senhor?" A verdade lampejou por minha mente em um momento, eu não poderia tê-lo buscado a menos que tivesse havido alguma influência prévia em minha mente para me fazer buscá-Lo. Eu orei, pensei eu, mas quando perguntei a mim mesmo, como eu vim a orar? Fui induzido a orar pela leitura das Escrituras. Como eu vim a ler as Escrituras? Eu as havia lido, mas o que me levou a assim proceder? Então em um instante, eu vi que Deus estava na base disto tudo, e que Ele foi o Autor da minha fé, e assim toda a doutrina da graça se tornou acessível a mim, e desta doutrina eu não me afastei até hoje, e desejo fazer desta, a minha confissão perpétua: "Eu atribuo minha conversão inteiramente a Deus".

Certa vez compareci a um culto aonde o texto veio a ser: "[Ele] escolherá para nós a nossa herança"1 e o bom homem que ocupou o púlpito era mais do que apenas um pouco arminiano. Por esta razão, quando começou, ele disse: "Esta passagem se refere inteiramente à nossa herança temporal, não tem nada a ver com nosso destino eterno, porque", disse ele, "nós não queremos que Cristo faça por nós a escolha do Céu ou do inferno. Isto é tão claro e direto, que cada homem que tenha um grão de senso comum irá escolher o Céu, e nenhuma pessoa será tão desajuizada que escolha o inferno. Não temos qualquer necessidade de alguma inteligência superior, ou de qualquer grande Ser, para escolher Céu ou inferno por nós. Isto é deixado para o nosso próprio livre-arbítrio, e temos bastante sabedoria dando-nos meios suficientemente corretos para julgar por nós mesmos," e, portanto, como ele muito logicamente inferiu, não há necessidade de Jesus Cristo, ou de qualquer outro, fazer a escolha por nós. Nós podemos escolher a herança por nós mesmos sem qualquer assistência. "Ah!" eu pensei, "mas, meu bom irmão, pode ser mesmo verdade que nós podemos, mas penso que precisamos querer algo mais que o senso comum antes que possamos escolher corretamente".

Primeiro, deixe-me perguntar, não devemos todos nós admitir uma soberana Providência, e a designação da mão do SENHOR, como os meios através dos quais nós viemos a este mundo? Aqueles homens que pensam que, depois de tudo, nós somos deixados ao nosso próprio livre-arbítrio para escolher este ou aquele para direcionar os nossos passos, deve admitir que nossa entrada neste mundo não aconteceu por nossa própria vontade, mas que Deus teve, naquela hora, que escolher por nós. Que circunstâncias foram aquelas, sob de nosso controle, que nos direcionaram a eleger certas pessoas como sendo nossos pais? Tivemos nós alguma coisa a ver com isto? Não foi o próprio Deus que determinou nossos pais, nosso local de nascimento, e amigos?

John Newton costumava contar uma parábola sobre uma boa mulher que, de modo a provar a doutrina da eleição, dizia: "Ah! meu caro, o Senhor deve ter me amado antes de eu nascer, ou caso contrário Ele não teria visto nada em mim para amar depois". Estou certo que é verdade no meu caso; Eu creio na doutrina da eleição, porque estou bem certo que, se Deus não me tivesse escolhido, eu nunca O teria escolhido; e tenho certeza que Ele me escolheu antes de eu nascer, ou caso contrário Ele nunca teria me escolhido depois; e Ele deve ter me eleito por razões desconhecidas por mim, porque eu nunca pude encontrar qualquer razão em mim mesmo pela qual Ele devesse me olhar com especial amor.

Se seria admirável ver um rio brotar da terra já crescido, tanto mais seria olhar pasmado para uma vasta fonte da qual todos os rios da terra saíssem borbulhando de uma só vez; um milhão deles nascendo em um só nascimento? Que visão haveria de ser! Quem pode concebê-la. E ainda assim o amor de Deus é aquela fonte, formando cada um dos rios de misericórdia, os quais têm sempre satisfeito nosso povo com todos os rios de graça durante o tempo, e de glória depois de subirem. Minh'alma, permaneça naquele manancial sagrado, e adore e exalte para todo o sempre a Deus, nosso Pai, que tem nos amado! Bem no início, quando este grande universo estava na mente de Deus, como florestas não nascidas na semente do carvalho; muito antes que os ecos acordassem os ermos; antes que as montanhas fossem geradas; e muito antes que a luz rompesse pelo céu, Deus amou estas criaturas escolhidas. Antes que houvesse qualquer ser criado, quando o éter ainda não havia sido agitado pelas asas do anjos, quando o próprio espaço ainda não tinha existência, quando não havia nada exceto Deus somente, mesmo então, naquela solidão de Deidade, e naquela penetrante quietude e profundidade, Seu coração se moveu com amor por seus escolhidos. Seus nomes estavam escritos em Seu coração, e então eram eles queridos de Sua alma. Jesus amou Seu povo antes da fundação do mundo, mesmo da eternidade! E quando Ele me chamou por Sua graça, me disse: "Porquanto com amor eterno te amei, por isso com benignidade te atraí"2.

Se qualquer um me perguntasse o que eu entendo por um Calvinista, eu responderia: "Ele é alguém que diz: Salvação do Senhor". Eu não consigo encontrar nas Escrituras nenhuma outra doutrina além desta. É a essência da Bíblia. "Só ele é a minha rocha e a minha salvação"3. Me diga qualquer coisa contrária a esta verdade, e será uma heresia; diga-me uma heresia, e eu acharei sua essência aqui: que ela se afastou desta grande, desta fundamental, desta firme verdade, "Deus é minha rocha e minha salvação".

Qual é a heresia de Roma, além da adição de algo aos perfeitos méritos de Jesus Cristo, o acréscimo de obras da carne, para auxiliar em nossa justificação? E qual é a heresia do arminianismo além de adicionar algo à obra do Redentor? Cada heresia, se trazida à pedra de toque, irá se descobrir aqui.

Eu tenho minha própria opinião particular de que não há tal coisa como pregar Cristo e Ele crucificado, a menos que nós preguemos que nos dias de hoje isto é chamado de Calvinismo. É um apelido chamar a isto de Calvinismo; o Calvinismo é o evangelho, e nada mais. Eu não creio que podemos pregar o evangelho, se não pregarmos a justificação pela fé, sem obras; nem sem pregarmos a soberania de Deus e Sua dispensação de graça; nem sem exaltarmos a eleição, pelo inalterável, eterno, imutável, conquistador amor do SENHOR; nem penso que podemos pregar o evangelho, a menos que o baseemos sobre a especial e particular redenção de Seu povo eleito e escolhido o qual Cristo formou sobre a cruz; nem posso eu compreender um evangelho que deixa santos decaírem após serem chamados, e sujeitar os filhos de Deus a serem queimados no fogo da condenação após terem uma vez crido em Jesus. Tal evangelho eu abomino.

Não há alma viva que defenda mais firmemente as doutrinas da graça que eu, e se algum homem me pergunta se porventura me envergonho de ser chamado Calvinista, respondo que eu não quero ser chamado de nada além de Cristão; mas se você me perguntar, eu defendo a visão doutrinária que foi defendida por João Calvino, eu replico, estou no centro de sua defesa, e estou feliz por professá-la.

Mas, longe de mim, sequer imaginar que Sião não contém nada além de Cristãos Calvinistas dentro de seus muros, ou que não há ninguém salvo que não defenda nossa visão. Creio que há multidões de homens que não conseguem ver estas verdades, ou, pelo menos, não conseguem vê-las do modo em que nós as colocamos, mas que não obstante, têm recebido a Cristo como seu Salvador, e são tão queridos do coração do Deus de graça como o mais ruidoso Calvinista dentro ou fora do Céu.

Frequentemente é dito que estas doutrinas nas quais nós cremos têm uma tendência de nos levar ao pecado. Eu tenho ouvido isto ser declarado muito positivamente: que aquelas grandes doutrinas que amamos, e que encontramos nas Escrituras, são licenciosas. Não sei quem terá a audácia de fazer esta afirmação, quando considerar que os mais santos dentre os homens têm crido nelas. Pergunto ao homem que se atreve a dizer que o Calvinismo é uma religião licenciosa, o que ele pensa do caráter de Agostinho, ou de Calvino, ou de Whitefield, que em sucessivas eras foram grandes expoentes do sistema da graça; ou o que diria dos Puritanos, cujas obras estão cheias delas? Se um homem tivesse sido um Arminiano naqueles dias, teria sido considerado o mais vil herege vivente, mas agora nós somos vistos como hereges, e eles como ortodoxos.

Nós temos retornado à velha escola; nós podemos traçar nossa linhagem desde os apóstolos. É aquele veio de livre-graça, correndo através da pregação de Batistas, os quais nos têm salvado como denominação. Não é por isto que nós não podemos permanecer onde estamos hoje. Nós podemos correr uma linha dourada até o próprio Jesus Cristo, através de uma santa sucessão de vigorosos pais, todos os quais defenderam estas gloriosas verdades; e podemos perguntar a seu respeito: "Onde você encontraria homens melhores e mais consagrados no mundo?". Nenhuma doutrina é tão planejada para preservar o homem do pecado quanto a doutrina da graça de Deus. Aqueles que a têm chamado de "doutrina licenciosa" não sabem nada a seu respeito. Coisas pobres da ignorância, eles mal souberam que seu próprio material ruim foi a mais licenciosa doutrina sob o céu. Se eles conhecessem a graça de Deus em verdade, eles logo iriam ver que não houve nada que preservasse mais da queda que o conhecimento de que somos eleitos de Deus desde a fundação do mundo. Não há nada como a crença na perseverança eterna, e na imutabilidade da afeição de meu Pai, que possa me manter mais perto Dele, pela simples razão da gratidão. Nada faz um homem mais virtuoso que a crença na verdade. Uma mentira doutrinária irá logo produzir uma prática mentirosa. Um homem não pode ter uma crença errada sem em algum momento futuro ter uma vida errônea. Eu creio que uma coisa naturalmente leva à outra.

De todos os homens, os que têm a mais desinteressada piedade, a mais sublime reverência, a mais ardente devoção, são aqueles que crêem que são salvos pela graça, sem obras, através da fé, e não de si mesmos, a qual é dom de Deus.4

Os Cristãos devem ter cautela, e ver que isto sempre é assim, a fim de que por quaisquer meios Cristo não seja novamente crucificado, e exposto ao vitupério5.

1 Salmo 47:4
2 Jeremias 31:3
3 Salmo 62:6
4 Efésios 2:8-9
5 Hebreus 6:6

A Falsa Doutrina do Evangelho da Água e do Espírito

Introdução
Esta doutrina pregada por Paul C. Jong, da Coréia, está sendo difundida através da Internet pela distribuição gratuita de livros eletrônicos (e-books), bem como pelo envio gratuito de cópias impressas destes livros através do correio.

Os livros, bem acabados e escritos com correção gramatical, são realmente atraentes à primeira vista, mas carecem de um melhor exame de seu conteúdo antes de aceitarmos a proposta de recebimento e divulgação dos mesmos.

Tem este estudo o objetivo de analisar objetivamente a doutrina do Evangelho da Água e do Espírito, conforme apresentada no livro "Você verdadeiramente nasceu de novo da Água e do Espírito?".

Análise de sua pregação
Paul C. Jong diz que Jesus através de seu batismo recebeu os pecados do mundo pela imposição de mãos de João o Batista. Diz ele que esta suposta1 imposição de mãos de João o Batista foi de fato o batismo de Jesus. Assim, ele incorretamente traduz batismo por imposição de mãos, e somente casualmente chega a se referir ao batismo com seu verdadeiro significado, que é a imersão. Continuando, diz Jong, que Jesus ao ser batizado assumiu os pecados do mundo e ao ser crucificado pagou por estes pecados, os quais ele carregou em si durante todo Seu ministério público.

Jong põe assim maior ênfase no batismo de Jesus que em Sua crucificação, chegando a dizer que se Jesus não tivesse sido batizado, sua crucificação teria sido inútil para todos nós.

Segue Jong baseando seu argumento em I João 5:6-8:

"Este é aquele que veio por água e sangue, isto é, Jesus Cristo; não só por água, mas por água e por sangue. E o Espírito é o que testifica, porque o Espírito é a verdade. (7) Porque três são os que testificam no céu: o Pai, a Palavra, e o Espírito Santo; e estes três são um. (8) E três são os que testificam na terra: o Espírito, e a água e o sangue; e estes três concordam num" (I João 5:6-8 ACF2).
Esta é uma passagem das mais difíceis, e os teólogos têm apresentado alguns significados diferentes para ela, especialmente quanto à significação da água neste contexto. Um aprofundamento nesta questão fugiria ao escopo deste estudo, mas é importante deixar claro que nenhuma das interpretações dos estudiosos da Palavra de Deus, em tempo algum, jamais, chegou à água com o sentido que quer o Sr. Paul Jong. Além disto, tenhamos presente, que uma das regras básicas para a interpretação bíblica afirma que, em hipótese alguma, podemos basear qualquer doutrina em um único verso. Assim, o sentido dado pelo Sr. Jong para a água teria que ter sido clara e inequivocamente apresentado em outros versos do texto bíblico, para que pudéssemos interpretá-lo desta forma.

Segundo ele, sem crer na água (no batismo de Cristo) tanto quanto no sangue é impossível a salvação. E este argumento é repetido à exaustão em seu livro. Mas, caso assim o fosse este ensino seria encontrado em alguma parte do Novo Testamento ou ainda do Velho Testamento, o que rigorosamente não ocorre. Não há qualquer ensino por parte de qualquer autor bíblico que, sequer de longe, mostre a posição assumida pelo Sr. Jong. Ele ainda argumenta que este seria o pensamento dos apóstolos, e que todos teriam crido desta forma. Como exemplo disto ele utiliza a passagem em I Pedro 3:20-21:

"Os quais noutro tempo foram rebeldes, quando a longanimidade de Deus esperava nos dias de Noé, enquanto se preparava a arca; na qual poucas (isto é, oito) almas se salvaram pela água; (21) Que também, como uma verdadeira figura, agora vos salva, o batismo, não do despojamento da imundícia da carne, mas da indagação de uma boa consciência para com Deus, pela ressurreição de Jesus Cristo" (I Pedro 3:20-21 ACF)
O significado claro que o apóstolo Pedro deu à água nesta passagem é que ela identifica aqueles que se salvam com Jesus na forma do batismo, representando sua morte, sepultamento e ressurreição.

Jong, contudo, interpreta esta passagem de forma torta dizendo: "Assim como, no tempo de Noé, as pessoas que não creram na imensidão de 'água' (o dilúvio) foram destruídas, aqueles que não crêem na 'água, o batismo de Jesus', certamente serão destruídos".

Esquece-se o Sr. Jong da própria promessa de Deus:

"E eu convosco estabeleço a minha aliança, que não será mais destruída toda a carne pelas águas do dilúvio, e que não haverá mais dilúvio, para destruir a terra. (12) E disse Deus: Este é o sinal da aliança que ponho entre mim e vós, e entre toda a alma vivente, que está convosco, por gerações eternas" (Gênesis 9:10-11 ACF)
Nunca mais haverá destruição pela água. E muito menos haverá destruição por não se crer na água.

Além disto, afirma o Sr. Jong, que poucos creram no "verdadeiro evangelho da água" no início da igreja, e que após o édito de Milão (313 d.C.) este "verdadeiro evangelho" desapareceu completamente, conforme fora planejado por Satanás, fazendo com que ninguém pudesse vir a ser salvo daí em diante. Ainda, segundo ele, durante o período da Reforma Protestante, o verdadeiro evangelho não foi encontrado, pois interpretaram erroneamente a Palavra de Deus, e somente agora, através de sua "redescoberta" do evangelho da água, o verdadeiro evangelho voltou à tona, como um rio que esteve por todo este tempo trafegando pelos subterrâneos da Terra, aflorando nestes tempos finais, através de sua pregação. Tristemente então, segundo Jong, ninguém nestes quase 2000 anos veio a ser salvo através do arrependimento de pecados e do crer no sacrifício de Jesus Cristo na cruz, em seu sangue derramado para remissão dos pecados.

Jong define o batismo como: "Ser lavado, ser enterrado (ser imerso) e, no sentido espiritual, transferir pecado por meio da imposição das mãos, como foi feito no Antigo Testamento"

Esta última frase (transferir pecado por meio da imposição das mãos) está completamente equivocada. Não há nada na Palavra de Deus, ou ainda que fosse em tradições, doutrinas ou costumes, sejam cristãos ou judaicos (já que fala de tradição do Antigo Testamento), que dê qualquer suporte a esta afirmação.

Mais para frente no texto Jong diz que: "Se Jesus não tivesse sido batizado antes de ser crucificado, todos os nossos pecados teriam permanecido".

Com isto ele coloca o batismo de Jesus em pé de igualdade com sua crucificação quanto à eficácia como ato remissório ou ainda mais importante, pois sem o primeiro o segundo não seria de qualquer valia.

O Sr. Jong deveria ouvir ao apóstolo Paulo, quando este explica o verdadeiro significado do batismo, deixando claro que a crucificação e a subseqüente ressurreição do Senhor Jesus Cristo, formam um ato sacrificial e remissório completo em si mesmo, não necessitando de qualquer complementação, seja anterior ou posterior:

"Ou não sabeis que todos quantos fomos batizados em Jesus Cristo fomos batizados na sua morte? (4) De sorte que fomos sepultados com ele pelo batismo na morte; para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos, pela glória do Pai, assim andemos nós também em novidade de vida. (5) Porque, se fomos plantados juntamente com ele na semelhança da sua morte, também o seremos na da sua ressurreição; (6) sabendo isto, que o nosso homem velho foi com ele crucificado, para que o corpo do pecado seja desfeito, para que não sirvamos mais ao pecado" (Romanos 6:3-6 ACF)
Conclusão
Sua visão sobre como levar sua mensagem às pessoas, através da internet e da distribuição gratuita de livros tem sido muito bem sucedida, inclusive com seus livros tendo sido traduzidos e publicados em vários idiomas inclusive o português.

Contudo sempre que alguém tenta apresentar uma doutrina diferente da que está apresentada na Palavra de Deus, devemos estar atentos, devemos sempre agir como aqueles de Beréia3 que conferiam tudo o que lhes era dito com as Escrituras Sagradas para ver se as coisas eram realmente assim, pois erros e heresias surgem diariamente, e devemos estar prontos a refutá-los:

"Retendo firme a fiel palavra, que é conforme a doutrina, para que seja poderoso, tanto para admoestar com a sã doutrina, como para convencer os contradizentes" (Tito 1:9 ACF)
E pior ainda, pelo fato do Sr. Jong não estar tratando de uma doutrina periférica, a doutrina da salvação é o centro, o cerne, do que é ser Cristão, daquilo que nos faz o que somos, o centro de nossa fé e esperança.

Muito melhor faria o Sr. Jong, se pregasse o verdadeiro evangelho, se usasse de seus recursos para levar ao ouvido das pessoas a sã doutrina conforme a Palavra de Deus, para que pelo ouvir pudessem vir a ser salvas. E que não criasse, como fez, outro evangelho além daquele que foi anunciado por Cristo e pelos apóstolos:

"Maravilho-me de que tão depressa passásseis daquele que vos chamou à graça de Cristo para outro evangelho; (7) O qual não é outro, mas há alguns que vos inquietam e querem transtornar o evangelho de Cristo.(8) Mas, ainda que nós mesmos ou um anjo do céu vos anuncie outro evangelho além do que já vos tenho anunciado, seja anátema. (9) Assim, como já vo-lo dissemos, agora de novo também vo-lo digo. Se alguém vos anunciar outro evangelho além do que já recebestes, seja anátema." (Gálatas 1:6-9 ACF)
Então, como o apóstolo Paulo nos exorta a fazer nesta passagem, consideremos o Sr. Jong anátema, e o deixemos por si só. E que Deus nos abençoe, nos proteja e nos ajude, para que sejamos instrumentos da Sua verdade para salvação das almas perdidas através da pregação do verdadeiro Evangelho de remissão dos pecados através do sangue derramado por Cristo Jesus na cruz do Calvário por cada um de nós.

Amém.

1 Não há indicação bíblica de que tenha ocorrido, no ato do batismo de Jesus, imposição de mãos. Nem que esta fosse a prática de João o Batista.
2 Todos os textos bíblicos citados neste estudo foram extraídos da tradução de João Ferreira de Almeida - Corrigida e Revisada Fiel ao Texto Original (ACF), editada pela Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil, em 1995.
3 Atos 17:10-11.

Confissão de Fé Waldense do Ano de 1120

Cremos e mantemos firmemente tudo o que está contido nos doze artigos do símbolo comumente chamado de Credo Apostólico, e consideramos herética qualquer inconsistência com eles.
Cremos que há um só Deus - o Pai, Filho e Espírito Santo.
Reconhecemos como Escrituras Sagradas e canônicas os livros da Bíblia Sagrada.
Os livros acima mencionados nos ensinam: que há um DEUS, todo-poderoso, ilimitado em sabedoria, infinito em bondade, e que, em Sua bondade, fez todas as coisas. Porque Ele criou Adão à Sua própria imagem e semelhança. No entanto, por causa da inimizade do diabo e sua própria desobediência, Adão caiu, o pecado entrou no mundo, e nos tornamos transgressores em e por Adão.
Cremos que Cristo havia sido prometido aos pais que receberam a lei, a fim de que, conhecendo seu pecado pela lei, e sua injustiça e insuficiência, pudessem desejar a vinda de Cristo para realizar a satisfação por seus pecados, e cumprir a Lei por Ele mesmo.
Cremos que no tempo determinado pelo Pai, Cristo nasceu - em um tempo em que abundava a iniqüidade, para manifestar que não era devido à nossa bondade, porque éramos pecadores, mas para que Ele, que é verdadeiro pudesse mostrar Sua graça e misericórdia a nós.
Que Cristo é nossa vida, verdade, paz e justiça - nosso pastor e advogado, nosso sacrifício e sacerdote, quem morreu pela salvação de todo aquele que crê, e que ressuscitou para a justificação deles.
E também cremos firmemente que não há outro mediador, ou advogado para com Deus o Pai senão Jesus Cristo. Com respeito à Virgem Maria, ela era santa, humilde e plena de graça; e isto também cremos com relação a todos os outros santos, que estão esperando no céu a ressurreição de seus corpos no dia do juízo.
Cremos também que, depois desta vida, existem apenas dois lugares - um para os que são salvos e outro para os condenados, os quais chamamos paraíso e inferno, respectivamente. Negamos por completo o purgatório imaginário do Anticristo, inventado para se opor à verdade.
Ademais, sempre temos considerado todas as invenções [em matéria de religião] como uma abominação indizível diante de Deus; citamos os dias festivos e vigílias dos santos, a chamada "água benta", o abster-se de carnes em certos dias e outras coisas parecidas; porém, sobre tudo isso, citamos as missas.
Mantemo-nos contra todas as invenções humanas, como procedentes do Anticristo, as quais produzem angústia e são prejudiciais para a liberdade da mente. [Provavelmente aqui temos uma alusão às penitências e práticas ascéticas - nota da versão espanhola]
Consideramos os Sacramentos como sinais das coisas santas ou como emblemas das bênçãos invisíveis. Cremos que justo e também necessário que os crentes se utilizem desses símbolos ou formas, quando possível. No entanto, sustentamos que os crentes podem ser salvos sem esses sinais, quando não dispõem do lugar ou da oportunidade de observá-los.
Não aprovamos outros sacramentos [como instrução divina], à parte do Batismo e da Ceia do Senhor.
Honramos os poderes seculares, com sujeição, obediência, prontidão e impostos.

Confissão de Fé Waldense do Ano de 1120

Cremos e mantemos firmemente tudo o que está contido nos doze artigos do símbolo comumente chamado de Credo Apostólico, e consideramos herética qualquer inconsistência com eles.
Cremos que há um só Deus - o Pai, Filho e Espírito Santo.
Reconhecemos como Escrituras Sagradas e canônicas os livros da Bíblia Sagrada.
Os livros acima mencionados nos ensinam: que há um DEUS, todo-poderoso, ilimitado em sabedoria, infinito em bondade, e que, em Sua bondade, fez todas as coisas. Porque Ele criou Adão à Sua própria imagem e semelhança. No entanto, por causa da inimizade do diabo e sua própria desobediência, Adão caiu, o pecado entrou no mundo, e nos tornamos transgressores em e por Adão.
Cremos que Cristo havia sido prometido aos pais que receberam a lei, a fim de que, conhecendo seu pecado pela lei, e sua injustiça e insuficiência, pudessem desejar a vinda de Cristo para realizar a satisfação por seus pecados, e cumprir a Lei por Ele mesmo.
Cremos que no tempo determinado pelo Pai, Cristo nasceu - em um tempo em que abundava a iniqüidade, para manifestar que não era devido à nossa bondade, porque éramos pecadores, mas para que Ele, que é verdadeiro pudesse mostrar Sua graça e misericórdia a nós.
Que Cristo é nossa vida, verdade, paz e justiça - nosso pastor e advogado, nosso sacrifício e sacerdote, quem morreu pela salvação de todo aquele que crê, e que ressuscitou para a justificação deles.
E também cremos firmemente que não há outro mediador, ou advogado para com Deus o Pai senão Jesus Cristo. Com respeito à Virgem Maria, ela era santa, humilde e plena de graça; e isto também cremos com relação a todos os outros santos, que estão esperando no céu a ressurreição de seus corpos no dia do juízo.
Cremos também que, depois desta vida, existem apenas dois lugares - um para os que são salvos e outro para os condenados, os quais chamamos paraíso e inferno, respectivamente. Negamos por completo o purgatório imaginário do Anticristo, inventado para se opor à verdade.
Ademais, sempre temos considerado todas as invenções [em matéria de religião] como uma abominação indizível diante de Deus; citamos os dias festivos e vigílias dos santos, a chamada "água benta", o abster-se de carnes em certos dias e outras coisas parecidas; porém, sobre tudo isso, citamos as missas.
Mantemo-nos contra todas as invenções humanas, como procedentes do Anticristo, as quais produzem angústia e são prejudiciais para a liberdade da mente. [Provavelmente aqui temos uma alusão às penitências e práticas ascéticas - nota da versão espanhola]
Consideramos os Sacramentos como sinais das coisas santas ou como emblemas das bênçãos invisíveis. Cremos que justo e também necessário que os crentes se utilizem desses símbolos ou formas, quando possível. No entanto, sustentamos que os crentes podem ser salvos sem esses sinais, quando não dispõem do lugar ou da oportunidade de observá-los.
Não aprovamos outros sacramentos [como instrução divina], à parte do Batismo e da Ceia do Senhor.
Honramos os poderes seculares, com sujeição, obediência, prontidão e impostos.

A Confissão de Fé da Guanabara (1558)

Histórico
No dia 7 de março de 1557 chegou a Guanabara um grupo de huguenotes (calvinistas franceses) com o propósito de ajudar a estabelecer um refúgio para os calvinistas perseguidos na França. Perseguidos também na Guanabara em virtude de sua fé reformada, alguns conseguiram escapar; outros, foram condenados à morte por Villegaignon, foram enforcados e seus corpos atirados de um despenhadeiro, em 1558. Antes de morrer, entretanto, foram obrigados a professar por escrito sua fé, no prazo de doze horas, respondendo uma série de perguntas que lhes foram entregues. Eles assim o fizeram, e escreveram a primeira confissão de fé na América (ver Apêndice 2), sabendo que com ela estavam assinando a própria sentença de morte.2

Texto da Confissão3
Segundo a doutrina de S. Pedro Apóstolo, em sua primeira epístola, todos os cristãos devem estar sempre prontos para dar razão da esperança que neles há, e isso com toda a doçura e benignidade, nós abaixo assinados, Senhor de Villegaignon, unanimemente (segundo a medida de graça que o Senhor nos tem concedido) damos razão, a cada ponto, como nos haveis apontado e ordenado, e começando no primeiro artigo:

I. Cremos em um só Deus, imortal, invisível, criador do céu e da terra, e de todas as coisas, tanto visíveis como invisíveis, o qual é distinto em três pessoas: o Pai, o Filho e o Santo Espírito, que não constituem senão uma mesma substância em essência eterna e uma mesma vontade; o Pai, fonte e começo de todo o bem; o Filho, eternamente gerado do Pai, o qual, cumprida a plenitude do tempo, se manifestou em carne ao mundo, sendo concebido do Santo Espírito, nasceu da virgem Maria, feito sob a lei para resgatar os que sob ela estavam, a fim de que recebêssemos a adoção de próprios filhos; o Santo Espírito, procedente do Pai e do Filho, mestre de toda a verdade, falando pela boca dos profetas, sugerindo as coisas que foram ditas por nosso Senhor Jesus Cristo aos apóstolos. Este é o único Consolador em aflição, dando constância e perseverança em todo bem.

Cremos que é mister somente adorar e perfeitamente amar, rogar e invocar a majestade de Deus em fé ou particularmente.

II. Adorando nosso Senhor Jesus Cristo, não separamos uma natureza da outra, confessando as duas naturezas, a saber, divina e humana nele inseparáveis.

III. Cremos, quanto ao Filho de Deus e ao Santo Espírito, o que a Palavra de Deus e a doutrina apostólica, e o símbolo,4 nos ensinam.

IV. Cremos que nosso Senhor Jesus Cristo virá julgar os vivos e os mortos, em forma visível e humana como subiu ao céu, executando tal juízo na forma em que nos predisse no capítulo vinte e cinco de Mateus, tendo todo o poder de julgar, a Ele dado pelo Pai, sendo homem.

E, quanto ao que dizemos em nossas orações, que o Pai aparecerá enfim na pessoa do Filho, entendemos por isso que o poder do Pai, dado ao Filho, será manifestado no dito juízo, não todavia que queiramos confundir as pessoas, sabendo que elas são realmente distintas uma da outra.

V. Cremos que no santíssimo sacramento da ceia, com as figuras corporais do pão e do vinho, as almas fiéis são realmente e de fato alimentadas com a própria substância do nosso Senhor Jesus, como nossos corpos são alimentados de alimentos, e assim não entendemos dizer que o pão e o vinho sejam transformados ou transubstanciados no seu corpo, porque o pão continua em sua natureza e substância, semelhantemente ao vinho, e não há mudança ou alteração.

Distinguimos todavia este pão e vinho do outro pão que é dedicado ao uso comum, sendo que este nos é um sinal sacramental, sob o qual a verdade é infalivelmente recebida. Ora, esta recepção não se faz senão por meio da fé e nela não convém imaginar nada de carnal, nem preparar os dentes para comer, como santo Agostinho nos ensina, dizendo: “Porque preparas tu os dentes e o ventre? Crê, e tu o comeste.”

O sinal, pois, nem nos dá a verdade, nem a coisa significada; mas Nosso Senhor Jesus Cristo, por seu poder, virtude e bondade, alimenta e preserva nossas almas, e as faz participantes da sua carne, e de seu sangue, e de todos os seus benefícios.

Vejamos a interpretação das palavras de Jesus Cristo: “Este pão é meu corpo.” Tertuliano, no livro quarto contra Marcião, explica estas palavras assim: “este é o sinal e a figura do meu corpo.”

S. Agostinho diz: “O Senhor não evitou dizer: — Este é o meu corpo, quando dava apenas o sinal de seu corpo.”

Portanto (como é ordenado no primeiro cânon do Concílio de Nicéia), neste santo sacramento não devemos imaginar nada de carnal e nem nos distrair no pão e no vinho, que nos são neles propostos por sinais, mas levantar nossos espíritos ao céu para contemplar pela fé o Filho de Deus, nosso Senhor Jesus, sentado à destra de Deus, seu Pai.

Neste sentido podíamos jurar o artigo da Ascensão, com muitas outras sentenças de Santo Agostinho, que omitimos, temendo ser longas.

VI. Cremos que, se fosse necessário pôr água no vinho, os evangelistas e São Paulo não teriam omitido uma coisa de tão grande conseqüência.

E quanto ao que os doutores antigos têm observado (fundamen­tando-se sobre o sangue misturado com água que saiu do lado de Jesus Cristo, desde que tal observância não tem fundamento na Palavra de Deus, visto mesmo que depois da instituição da Santa Ceia isso aconteceu), nós não podemos hoje admitir necessariamente.

VII. Cremos que não há outra consagração senão a que se faz pelo ministro, quando se celebra a ceia, recitando o ministro ao povo, em linguagem conhecida, a instituição desta ceia literalmente, segundo a forma que nosso Senhor Jesus Cristo nos prescreveu, admoestando o povo quanto à morte e paixão do nosso Senhor. E mesmo, como diz santo Agostinho, a consagração é a palavra de fé que é pregada e recebida em fé. Pelo que, segue-se que as palavras secretamente pronunciadas sobre os sinais não podem ser a consagração como aparece da instituição que nosso Senhor Jesus Cristo deixou aos seus apóstolos, dirigindo suas palavras aos seus discípulos presentes, aos quais ordenou tomar e comer.

VIII. O santo sacramento da ceia não é alimento para o corpo como para as almas (porque nós não imaginamos nada de carnal, como declaramos no artigo quinto) recebendo-o por fé, a qual não é carnal.

IX. Cremos que o batismo é sacramento de penitência, e como uma entrada na igreja de Deus, para sermos incorporados em Jesus Cristo. Representa-nos a remissão de nossos pecados passados e futuros, a qual é adquirida plenamente, só pela morte de nosso Senhor Jesus.

De mais, a mortificação de nossa carne aí nos é representada, e a lavagem, representada pela água lançada sobre a criança, é sinal e selo do sangue de nosso Senhor Jesus, que é a verdadeira purificação de nossas almas. A sua instituição nos é ensinada na Palavra de Deus, a qual os santos apóstolos observaram, usando de água em nome do Pai, do Filho e do Santo Espírito. Quanto aos exorcismos, abjurações de Satanás, crisma, saliva e sal, nós os registramos como tradições dos homens, contentando-nos só com a forma e instituição deixada por nosso Senhor Jesus.

X. Quanto ao livre arbítrio, cremos que, se o primeiro homem, criado à imagem de Deus, teve liberdade e vontade, tanto para bem como para mal, só ele conheceu o que era livre arbítrio, estando em sua integridade. Ora, ele nem apenas guardou este dom de Deus, assim como dele foi privado por seu pecado, e todos os que descendem dele, de sorte que nenhum da semente de Adão tem uma centelha do bem.

Por esta causa, diz São Paulo, o homem natural não entende as coisas que são de Deus. E Oséias clama aos filhos de Israel: “Tua perdição é de ti, ó Israel.” Ora isto entendemos do homem que não é regenerado pelo Santo Espírito.

Quanto ao homem cristão, batizado no sangue de Jesus Cristo, o qual caminha em novidade de vida, nosso Senhor Jesus Cristo restitui nele o livre arbítrio, e reforma a vontade para todas as boas obras, não todavia em perfeição, porque a execução de boa vontade não está em seu poder, mas vem de Deus, como amplamente este santo apóstolo declara, no sétimo capítulo aos Romanos, dizendo: “Tenho o querer, mas em mim não acho o realizar.”

O homem predestinado para a vida eterna, embora peque por fragilidade humana, todavia não pode cair em impenitência.

A este propósito, S. João diz que ele não peca, porque a eleição permanece nele.

XI. Cremos que pertence só à Palavra de Deus perdoar os pecados, da qual, como diz santo Ambrósio, o homem é apenas o ministro; portanto, se ele condena ou absolve, não é ele, mas a Palavra de Deus que ele anuncia.

Santo Agostinho, neste lugar diz que não é pelo mérito dos homens que os pecados são perdoados, mas pela virtude do Santo Espírito. Porque o Senhor dissera aos seus apóstolos: “recebei o Santo Espírito;” depois acrescenta: “Se perdoardes a alguém os seus pecados,” etc.

Cipriano diz que o servo não pode perdoar a ofensa contra o Senhor.

XII. Quanto à imposição das mãos, essa serviu em seu tempo, e não há necessidade de conservá-la agora, porque pela imposição das mãos não se pode dar o Santo Espírito, porquanto isto só a Deus pertence.

No tocante à ordem eclesiástica, cremos no que S. Paulo dela escreveu na primeira epístola a Timóteo, e em outros lugares.

XIII. A separação entre o homem e a mulher legitimamente unidos por casamento não se pode fazer senão por causa de adultério, como nosso Senhor ensina (Mateus 19:5). E não somente se pode fazer a separação por essa causa, mas também, bem examinada a causa perante o magistrado, a parte não culpada, se não podendo conter-se, deve casar-se, como São Ambrósio diz sobre o capítulo sete da Primeira Epístola aos Coríntios. O magistrado, todavia, deve nisso proceder com madureza de conselho.

XIV. São Paulo, ensinando que o bispo deve ser marido de uma só mulher, não diz que não lhe seja lícito tornar a casar, mas o santo apóstolo condena a bigamia a que os homens daqueles tempos eram muito afeitos; todavia, nisso deixamos o julgamento aos mais versados nas Santas Escrituras, não se fundando a nossa fé sobre esse ponto.

XV. Não é lícito votar a Deus, senão o que ele aprova. Ora, é assim que os votos monásticos só tendem à corrupção do verdadeiro serviço de Deus. É também grande temeridade e presunção do homem fazer votos além da medida de sua vocação, visto que a santa Escritura nos ensina que a continência é um dom especial (Mateus 15 e 1 Coríntios 7). Portanto, segue-se que os que se impõem esta necessidade, renunciando ao matrimônio toda a sua vida, não podem ser desculpados de extrema temeridade e confiança excessiva e insolente em si mesmos.

E por este meio tentam a Deus, visto que o dom da continência é em alguns apenas temporal, e o que o teve por algum tempo não o terá pelo resto da vida. Por isso, pois, os monges, padres e outros tais que se obrigam e prometem viver em castidade, tentam contra Deus, por isso que não está neles o cumprir o que prometem. São Cipriano, no capítulo onze, diz assim: “Se as virgens se dedicam de boa vontade a Cristo, perseverem em castidade sem defeito; sendo assim fortes e constantes, esperem o galardão preparado para a sua virgindade; se não querem ou não podem perseverar nos votos, é melhor que se casem do que serem precipitadas no fogo da lascívia por seus prazeres e delícias.” Quanto à passagem do apóstolo S. Paulo, é verdade que as viúvas tomadas para servir à igreja, se submetiam a não mais casar, enquanto estivessem sujeitas ao dito cargo, não que por isso se lhes reputasse ou atribuísse alguma santidade, mas porque não podiam bem desempenhar os deveres, sendo casadas; e, querendo casar, renunciassem à vocação para a qual Deus as tinha chamado, contudo que cumprissem as promessas feitas na igreja, sem violar a promessa feita no batismo, na qual está contido este ponto: “Que cada um deve servir a Deus na vocação em que foi chamado.” As viúvas, pois, não faziam voto de continência, senão porque o casamento não convinha ao ofício para que se apresentavam, e não tinha outra consideração que cumpri-lo. Não eram tão constrangidas que não lhes fosse antes permitido casar que se abrasar e cair em alguma infâmia ou desonestidade.

Mas, para evitar tal inconveniência, o apóstolo São Paulo, no capítulo citado, proíbe que sejam recebidas para fazer tais votos sem que tenham a idade de sessenta anos, que é uma idade normalmente fora da incontinência. Acrescenta que os eleitos só devem ter sido casados uma vez, a fim de que por essa forma, tenham já uma aprovação de continência.

XVI. Cremos que Jesus Cristo é o nosso único Mediador, intercessor e advogado, pelo qual temos acesso ao Pai, e que, justificados no seu sangue, seremos livres da morte, e por ele já reconciliados teremos plena vitória contra a morte.

Quanto aos santos mortos, dizemos que desejam a nossa salvação e o cumprimento do Reino de Deus, e que o número dos eleitos se complete; todavia, não nos devemos dirigir a eles como intercessores para obterem alguma coisa, porque desobedeceríamos o mandamento de Deus. Quanto a nós, ainda vivos, enquanto estamos unidos como membros de um corpo, devemos orar uns pelos outros, como nos ensinam muitas passagens das Santas Escrituras.

XVII. Quanto aos mortos, São Paulo, na Primeira Epístola aos Tessalonicenses, no capítulo quatro, nos proíbe entristecer-nos por eles, porque isto convém aos pagãos, que não têm esperança alguma de ressuscitar. O apóstolo não manda e nem ensina orar por eles, o que não teria esquecido se fosse conveniente. S. Agostinho, sobre o Salmo 48, diz que os espíritos dos mortos recebem conforme o que tiverem feito durante a vida; que se nada fizeram, estando vivos, nada recebem, estando mortos.

Esta é a resposta que damos aos artigos por vós enviados, segundo a medida e porção da fé, que Deus nos deu, suplicando que lhe praza fazer que em nós não seja morta, antes produza frutos dignos de seus filhos, e assim, fazendo-nos crescer e perseverar nela, lhe rendamos graças e louvores para sempre. Assim seja.

Jean du Bourdel, Matthieu Verneuil, Pierre Bourdon, André la Fon.

1 Extraída de Paulo R. B. Anglada, Sola Scriptura: A Doutrina Reformada das Escrituras (São Paulo: Editora Os Puritanos, 1998), 190-197.
2 O relato da história dos mártires huguenotes no Brasil, bem como a Confissão de Fé que escreveram, encontra-se no livro A Tragédia da Guanabara: História dos Protomartyres do Christianismo no Brasil, traduzido por Domingos Ribeiro; de um capítulo intitulado On the Church of the Believers in the Country of Brazil, part of Austral America: Its Affliction and Dispersion, do livro de Jean Crespin: l’Histoire des Martyres, originalmente publicado em 1564. Este livro, por sua vez, é uma tradução de um pequeno livro: Histoire des choses mémorables survenues en le terre de Brésil, partie de l’ Amérique australe, sous le governement de N. de Villegaignon, depuis l’ an 1558, publicado em 1561, cuja autoria é atribuída a Jean Lery, um dos huguenotes que vieram para o Brasil em 1557, o qual também publicou outro livro sobre sua viagem ao Brasil: Histoire d’an voyage fait en la terre du Brésil.
3 O texto foi transcrito de Jean Crespin, A Tragédia da Guanabara; História dos Protomartyres do Christianismo no Brasil, 65-71. O português antigo de Domingos Ribeiro (o tradutor) foi atualizado.